Indo além do indicador preferido de Buffet

30/03/2021

O grande gestor Warren Buffet é pragmático. Seu indicador preferido, no que diz respeito ao mercado de ações, é aquele que mede o valor das ações em relação ao que é produzido no país. Quanto mais alta for esta relação, mais vulnerável estará o mercado de ações a possíveis correções de preços.

Durante a segunda metade da década de 90, Buffet foi considerado, por muitos, como um investidor ultrapassado. O gestor, conhecido como o Oráculo de Omaha, optou por não embarcar naquela euforia com ações de empresas ligadas a internet e, justamente por isso, amargou um longo período de underperformance no mercado. Naquela ocasião, aquele indicador, que hoje é conhecido como o indicador preferido de Buffet, estava próximo de 160%. Isto é, o valor das ações contidas no índice Wilshire 5.000 era 1,6x superior ao PIB dos EUA.

Passados mais de 20 anos, temos hoje, nos EUA, uma situação ainda mais assustadora. Em janeiro deste ano, tal indicador chegou a se aproximar de 200%. Por isso, há quem diga que não há dúvidas de que exista uma bolha associada a determinados setores no mercado acionário dos EU.

Mergulhando um pouco nesta análise, compartilho abaixo um gráfico que ilustra o crescimento do PIB nominal americano, o comparando com o crescimento na lucratividade das empresas com base em dados fornecidos pela receita federal dos EUA. 

Observe como a lucratividade corporativa (ilustrada acima pelas linhas verde e azul) se compara com o crescimento do PIB nominal (linha vermelha) ao longo dos anos. Veja como, nos últimos 10 anos, a linha vermelha é mais inclinada do que as linhas verde e azul! Em outras palavras, o crescimento da lucratividade corporativa é inferior ao crescimento do PIB nominal!

Se você não ficou chocado com esta afirmação é sinal de que não fui claro o suficiente. Sendo assim, formulo uma pergunta de outra forma: como pode a relação (valor de mercado/PIB) está batendo recordes se a lucratividade corporativa dos últimos 10 anos cresce a um ritmo inferior à do PIB?

1. Será que o mercado está apostando em uma explosão de crescimento da lucratividade corporativa nos próximos anos?

2. Será que a métrica de lucratividade corporativa utilizada pelo mercado é diferente da métrica utilizada pela receita federal dos EUA?

As perguntas acima são pertinentes. Quanto à primeira, embora haja otimismo com o processo de reabertura da economia dos EUA, a taxa de crescimento de longo prazo tende a ser inferior a histórica devido ao maior endividamento do país e ao declínio na taxa de crescimento populacional. Já a segunda é mais interessante, pois qualquer um ligado na mídia está sempre ouvindo a respeito de lucros crescentes nos EUA. Especula-se que, de acordo com a empresa FactSet, o lucro consolidado das empresas do índice S&P 500 ficará em 175 dólares em 2021 e se aproximará de 200 dólares em 2022. E aí, quem está certo?

Há certamente diferenças metodológicas e outros fatores. Contudo, acho que o gráfico acima, apresentado por uma das figuras mais respeitadas do mercado -- o Dr. Lacy Hunt -- nos deve fazer refletir a respeito do nível de falcatruas presente nos mercados. O economista Galbraith, em seu clássico "The Great Crash, 1929" nomeou tal evento de Bezzle. E ele está nas alturas. Ontem, no caso do Family Office Archegos Capital, vimos uma ponta do iceberg. Neste caso, sem entrar em muitos detalhes, a ilegalidade talvez esteja no fato de que eu, você e o resto do mercado, não sabíamos que operações alavancadas em 30:1 ainda eram práticas recorrentes dos "Prime Brokers".

Marink Martins

www.myvol.com.br