"More Fools Than Money"

27/08/2024

Uma vez me disseram que ganhar dinheiro investindo em ações não é difícil. Basta saber como está, em um determinado momento, o equilíbrio entre o número de "tolos" e a liquidez presente em um determinado mercado. Se a variação positiva no número de "tolos" for superior a variação na quantidade de dinheiro em circulação ("liquidez"), é recomendado que você venda tudo e saia de férias. Caso contrário, é possível que seja hora de investir com convicção.  

A afirmação acima é uma brincadeira que traz consigo uma verdade: o aumento da liquidez (quantidade de dinheiro em circulação) é um dos principais fatores que contribuem para um ciclo de alta nas bolsas de valores. 

Abordo este tema, pois o Brasil e os EUA vivem um momento distinto no que diz respeito a expansão monetária. Sabe-se que os americanos foram extremamente agressivos no período pós-pandêmico. Eles expandiram seus agregados monetários de forma significativa e colocaram dinheiro na mão dos estados, das empresas e das pessoas físicas. Como resultado obtiveram um forte crescimento econômico acompanhado de um salto na inflação. Viveram um período que hoje é denominado de Excepcionalismo Americano

Neste período de Excepcionalismo testemunhamos diversas insanidades. Tivemos a especulação associada aos "meme stocks" como GameStop, AMC, e muitas outras. Kathie Woods e seu "ARK Innovation Fund" brilharam em 2021. Quando a insanidade parecia ter se dissipado em meio ao salto inflacionário, eis que surge a narrativa associada a inteligência artificial. Os preços das ações dispararam assim como os preços dos imóveis. Muitos americanos passaram a viajar pelo mundo achando tudo baratíssimo. Outros optaram por investir em "memorabilia" como nesta camisa uma vez usada pelo jogador de baseball Babe Ruth que acaba de ser vendida pelo valor de 24,1 milhões de dólares! (Um recorde!)

Já no Brasil, ainda que a impressão de dinheiro também tenha sido expressiva, o que se viu por aqui foi um processo de aversão a risco, onde diversos investidores correram para o conforto dos títulos atrelados ao CDI. 

No gráfico abaixo, temos um comparativo de performance entre o IBOV e o S&P 500 a partir do ano de 2016. Aqui, vale destacar que a "outperformance" do IBOV durante o período entre 2016 e 2020 foi praticamente eliminada no período pós-pandêmico. No entanto, não podemos esquecer que a comparação abaixo considera o IBOV em reais e o S&P 500 em dólares. Não podemos esquecer que a quantidade de dólares e de reais em circulação é uma variável importantíssima para que esta análise faça algum sentido. 

Acima, um gráfico preparado pelo Rodrigo Côrtes, da Avera Trading. 

Chegamos a um ponto em que o ritmo de expansão monetária nos EUA é hoje bem mais lento do que se vem observando no Brasil. Nos últimos 12 meses, o agregado monetário M2 (papel moeda, reservas bancárias, dinheiro em conta corrente e depósitos a prazo) brasileiro subiu 15%. Enquanto isso, o M2 americano subiu somente 1,1%.

Ao compararmos os índices ajustados pela quantidade de dinheiro em circulação (M2) temos uma imagem que é completamente distinta da apresentada acima. 

Observe que, quando ajustamos os índices ao M2 de cada país, temos um IBOV que se valorizou somente 25% em relação ao patamar registrado em janeiro de 2016. Já o S&P 500 (levando em consideração os dividendos pagos -- "total return") praticamente dobrou durante o mesmo período. Penso que nos próximos meses, este "GAP" de performance estará sujeito a uma forte compressão. Dentre as razões para esta afirmação, temos:

  1. Um cenário de dólar mais fraco. Este fenômeno já está em curso por diversas razões. A principal diz respeito ao fato de que o FED já sinalizou que entrará em um processo de redução do "FED Funds". Além disso, há uma chance de que o processo de desaceleração econômica nos EUA resulte em uma recessão. Já no Brasil, a expectativa é de um crescimento do PIB Real na faixa de 2,5%. 
  2. Maior expansão monetária no Brasil. Conforme já mencionado, o M2 brasileiro vem crescendo a um ritmo bem mais acelerado do que o M2 americano. Além disso, nos EUA a redução do total de ativos do FED (conhecido como QT -- "quantitative tightening") persistirá por mais de um ano. O FED deseja reduzir o montante de reservas bancárias excedentes para um patamar que é inferior ao nível atual em aproximadamente 500 bilhões de dólares. Assim, a redução da taxa de juros do FED enfrentará a resistência de um programa de QT que continuará a drenar liquidez dos mercados. 
  3. Maior crescimento da lucratividade no Brasil. O lucro consolidado das empresas do S&P 500 cresceu de 160 dólares (2019) para 225 dólares (2023). Enquanto todos esperam por uma continuidade deste crescimento em 2024 e 2025, há indícios de que o ritmo de crescimento da lucratividade corporativa no Brasil, não só será maior, mas também mais previsível. 

Por estas razões e muitas outras, há indícios de que é chegada a hora de uma convergência no gráfico que ilustra o IBOV em reais e o S&P 500 em dólares. Se pensarmos em um horizonte de tempo mais longo, uma "outperformance" do IBOV em reais é praticamente uma certeza matemática. Afinal, no Brasil, estamos claramente em um cenário de "MORE MONEY THAN FOOLS", enquanto nos EUA parece ocorrer o oposto: "MORE FOOLS THAN MONEY". 

Marink Martins

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