Não é porque você está paranoico que eles não estão, de fato, querendo te pegar!

01/06/2019

O fascínio despertado pelo mercado de ações reside no fato de que este é um sistema complexo, afetado por inúmeras forças que ora faz com que este se comporte de forma aleatória, ora de forma como se seguisse padrões. E o impressionante é que tudo fica muito claro a posteriori.

Em que fase do ciclo econômico estamos? Gostaria muito de saber esta resposta em se tratando dos EUA, do Brasil. Será que é possível o Brasil viver um ciclo expansionista ao mesmo tempo em que os EUA entram em uma recessão? Essas são perguntas interessantes. Boas para discutir em uma sala da aula, na mesa de um bar... Não há, entretanto, como obter respostas precisas a tais perguntas. São respostas que - utilizando a ironia popular - quem souber morre!

Assim, em meio a toda esta incerteza, surge a paranoia. Dizem que nesta patologia o indivíduo desenvolve uma desconfiança ou suspeita exacerbada ou injustificada de que está sendo perseguido, acreditando que algo ruim está para acontecer ou que o perseguidor deseja lhe causar mal. Não sei não, mas que ELES QUEREM TOMAR O MEU DINHEIRO, isso eu não tenho a menor dúvida!

Ainda não conheci um trader que não seja paranoico. A verdade é que aqueles que não eram, ou abandonaram a carreira, ou foram expulsos do mercado. Ser trader é navegar pela complexidade utilizando como uma única ferramenta algum mecanismo que faça uso da técnica de TENTATIVA & ERRO.

Observe o gráfico abaixo:


Assumindo que o leitor esteja sintonizado com os mercados internacionais, esse gráfico - carente de descrição - é capaz de te deixar no mínimo intrigado. O eixo vertical te leva a pensar no índice S&P 500 que vem registrando quedas nas últimas semanas em meio ao colapso nas negociações comerciais entre os EUA e a China. Mas o período ilustrado no eixo horizontal parece contraditório, pois não se encaixa na sua memória gráfica para o mais importante índice de ações norte-americano.

Talvez você pense que seja uma projeção feita por algum paranoico que julga que a bolsa americana esteja cara e que, em breve, levará um tombo capaz de fazer com que o índice retorne para o mesmo patamar da época em que Donald Trump assumiu a presidência dos EUA - o patamar de 2.100 pontos.

Mas o fato é que não se trata de um gráfico do índice S&P 500. O que temos aí é o gráfico do Dow Jones Industrial Average durante o ano de 1987. A queda expressiva vista entre os meses de setembro e novembro foi o infame "Black Monday" ocorrido no dia 19 de outubro de 1987.

Dentre as curiosidades associadas ao dia do crash de 87, uma que julgo estar entre as mais interessantes, é o fato de que o (na época, recém-empossado chefe do FED), Alan Greenspan, durante aquela segunda-feira - no horário em que os mercados estavam abertos - estava em um voo para Dallas, sem comunicação alguma com as pessoas em solo. Assim, nada pode ser feito como estratégia de reação da autoridade monetária americana. Uma outra curiosidade diz respeito ao fato de que, por muito pouco, as bolsas não abriram no dia seguinte. Havia um saldo de US$400 milhões que não fora depositado por clientes que necessitavam pagar os devidos ajustes de liquidação. Abaixo, o diálogo entre Leo Melamed, presidente do CME, e Alan Greenspan, na noite daquela segunda-feira negra:

"'Will you open tomorrow?' he asked. That was the scariest moment because the truthful answer I gave was 'I do not know.' What the Fed Chair was really asking was: 'Will the longs pay the shorts?'"

(Você vai conseguir abrir a bolsa amanhã? Ele perguntou. Esse foi o momento mais assustador pois a resposta verdadeira que tive que dar foi "eu não sei". O que o presidente do FED queria saber era o seguinte: Os comprados irão conseguir pagar os vendidos?)

Refletindo a respeito do tema hoje, US$400 milhões parece ser um trocado. Para ocupar as "headlines" de hoje teríamos que ter algo superior a US$20 bilhões. Mesmo assim, um evento ocorrido há menos de 10, conhecido como "flash crash" representou uma espécie de pânico jamais visto antes. Até hoje pouco se sabe a respeito do que de fato provocou aquele evento.

Para um paranoico, o fato do índice S&P 500 negociar hoje em patamar semelhante aquele registrado pelo DOW há 32 anos, é uma coincidência que... sei não, parece ser um tanto sinistra, rsrs. Mas, falando sério, um historiador pode, sem muitas dificuldades, identificar inúmeras semelhanças e diferenças entre o ocorrido em 1987 e os dias de hoje. Conforme mencionei anteriormente, o sistema é complexo!

No domingo que antecedeu o BLACK MONDAY o Secretário do Tesouro dos EUA, James Baker, discursando na Alemanha disse aos seus colegas do Bundesbank: "Either inflate the mark or we`ll devalue the dollar." (Promovam uma valorização no marco alemão ou iremos desvalorizar o dólar). Analisando a posteriori, esta ameaça se destaca como um dos eventos catalisadores para o ocorrido no dia seguinte.

Este texto não tem um objetivo específico de atribuir probabilidades para eventos que possam ocorrer na próxima semana. O meu objetivo aqui é promover uma reflexão a respeito das incertezas presentes nos mercados. Para ser sincero, estamos diante de um discurso que será feito pelas autoridades chinesas na manhã deste domingo. Espero que não seja nada demais.

Dito isso, não estamos aqui para ser torcedores em um mundo complexo como o do mercado de capitais. Buscamos resiliência. Buscamos fazer com que o nosso patrimônio cresça de forma sustentável, minimizando a possibilidade de movimentos adversos. Queremos estar preparados para enfrentar a adversidade com a liquidez necessária para tirar proveito do evento.

Assim, te deixo com um texto escrito pelo famoso investidor Paul Tudor Jones no dia 24 de setembro daquele ano (aproximadamente um mês antes do evento). Observe que Tudor Jones conclui com uma expressão que uso com frequência por aqui: CAVEAT EMPTOR (Cuidado comprador!)


Marink Martins

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