Por uma melhor compreensão dos riscos associados ao velho continente!
Queira ou não somos todos americanizados. Em termos de disseminação de sua própria cultura através da música, dos esportes, do cinema, o sucesso americano não tem comparação. No mercado financeiro não é diferente. Estamos todos constantemente antenados com o que ocorre em Nova York. O nosso posicionamento geográfico (com fuso horário quase que coincidente com NY) é também um fator extremamente importante. Sem desmerecer os méritos deste vínculo entre brasileiros e americanos, quero argumentar aqui que devemos alocar um maior espaço em nossas tumultuadas agendas para buscar uma melhor compreensão a respeito do problema europeu! É possível que nos próximos 12 meses ele seja mais importante do que a constatação ou não de uma recessão nos EUA.
Escrevo sobre isso animado por um comentário que tive acesso escrito pelo analista Nick Andrews que cobre o mercado europeu para a casa de pesquisa Gavekal. Nick nos fala sobre a luta exaustiva por parte do BCE ("Banco Central Europeu") em reduzir o que o mercado chama de fragmentação na zona do euro -- isto é, o alargamento dos diferenciais de taxas de juros em títulos de mesmo prazo entre países do norte da Europa, como a Alemanha, e os do sul da Europa, como a Itália.
Em março de 2020, Christine Lagarde disse ao mundo que não era o papel do BCE promover um encurtamento destes diferenciais de taxas de juros ("spreads"). No entanto, tudo que o BCE vem fazendo é justamente isso. Após o recente estresse no início de junho que levou os "spreads" entre títulos de 10 anos da Alemanha e Itália a atingir um patamar superior a 250 basis points (2,5%), o BCE reagiu e "tirou da cartola" mais uma promessa ao mercado: um novo mecanismo "anti-fragmentação"! Este mecanismo será apresentado ao mercado no dia 21 de julho e poderá se provar relevante ao comportamento dos preços dos ativos globais.
Em seu texto, Nick, de forma interessante, cita o trilema político associado a globalização enunciado pelo professor da Harvard, Dan Rodrik, que diz: É impossível ter, ao mesmo tempo, democracia, soberania nacional e integração global. A presença destes três atributos ao mesmo tempo é algo incompatível, de acordo com Rodrik.
A minha interpretação de tudo que li sobre este tema é de que, em breve, veremos cidadãos do sul da Europa reclamando do BCE de forma análoga a observada quando latinos e cidadãos do sudeste asiático reclamavam do FMI. Não vai demorar muito e a parte rica da Europa vai querer emplacar uma espécie de "Consenso de Washington" aos cidadãos do sul. (para entender mais sobre tal consenso, clique aqui.)
Será que vai funcionar? O veterano Charles Gave pensa que não e já nos avisa a respeito disso por mais de 10 anos. A profecia "gaviana" vem ganhando espaço. Te convido a dedicar uma maior atenção a questão europeia.
Marink Martins