De olho na "Mrs. Watanabe"

30/04/2024

Watanabe é o quinto sobrenome mais comum no Japão, e após o estouro da bolha japonesa no fim dos anos 80, tal nome foi atribuído às donas de casas do país que passaram a se envolver intensamente em uma operação financeira conhecida como "carry trade". De forma mais simples, tal operação consiste na obtenção de recursos em um lugar onde a taxa de juros é baixíssima (Japão) para direcionamento em aplicações financeiras em um lugar onde o rendimento é relativamente alto (EUA, Brasil, México, e outros). Tal operação pode envolver uma proteção cambial ou não.

Deseja entender melhor o movimento das Mrs. Watanabes ocorrido nos anos 90? Acesse este vídeo ao clicar aqui.

Na essência, uma operação de "carry trade" pode ser vista como um "long/short" ou uma operação de "swap" -- operações em que (em muitos casos) há um "descasamento" entre ativos e passivos. As Mrs. Watanabes tinham uma dívida bancária (passivo) denominada em ienes combinadas com investimentos em "treasuries" denominados em dólares (ativo). Nos momentos em que a taxa de câmbio de USD/JPY permanecia estável, elas lucravam com o diferencial de rendimentos que -- em algumas ocasiões -- chegava a 5% ao ano. Quando tudo estava "calmo", as operações de "carry trades" eram sensacionais.

O problema é que, em se tratando de mercados, f/x, criptos, treasuries, e até mesmo a renda variável fazem a mesma coisa: variam!!! Tais variações tendem a ser modestas (observadas no dia a dia dos mercados), mas podem ser dramáticas como aquelas vistas em 2008 e 2020. Às vezes elas ocorrem de forma exclusiva em determinados mercados, como no mercado de "treasuries" ao longo de 2022, ou no mercado de câmbio em 2015 quando a relação EUR/CHF (franco suíço) foi para o "espaço"! Nestas horas, a operação de "carry trade" deixa de ser sensacional e passa a ser um enorme pesadelo.

Leitores da obra de Nassim Taleb estão bem familiarizados com a anedota do peru do dia de ação de graças: "A ave é alimentada ao longo de todo o ano e no fim até acredita que o açougueiro é seu amigo", até que, em um determinado dia de novembro, eis que ocorre um evento conhecido como "cisne negro" em sua vida...

"Carry Trades" apresentam uma relação risco/retorno assimétrica. Críticos dirão que "come-se como um pinto, e defeca-se como um pato". Já os sobreviventes buscam força na frase que é título do famoso livro do fundador da Intel ("Andrew Grove"): "Somente os paranóicos sobrevivem!".

Dou toda esta volta para dizer o seguinte: de acordo com a Gavekal, considerando a importância do ativo, não há anomalia maior neste momento do que a defasagem do iene em relação ao dólar. A moeda japonesa está 40% abaixo do valor considerado justo segundo o conceito da paridade do poder de compra.

Ontem, a taxa USD/CNY chegou a atingir 160, e em seguida, recuou rapidamente para 155. Há quem diga que o BoJ (Banco Central do Japão) interveio. É possível que haja uma reversão na tendência de depreciação do iene por algumas razões. Dentre elas, vale explorar alguns possíveis catalisadores:

1. Um FED mais acomodativo

2. Intervenções do BoJ vendendo "treasuries" ou elevando a taxa de juros dos títulos japoneses.

3. O PBoC (Banco Central Chinês) pode entrar comprando ienes e, subsequentemente, títulos japoneses ("JGBs"). Isso seria uma forma indireta de diminuir a pressão na sua própria moeda (o iuane).

Caso isso ocorra, diversas operações de "carry trade" poderão ser desmontadas. Quando o assunto é "carry trade", os títulos brasileiros e seus altos rendimentos são sempre protagonistas. Neste sentido vale a pergunta: e se as "Mrs Watanabes" decidirem "trocar" a renda fixa brasileira pela renda renda variável brasileira?

Tal possibilidade pode ser um mero desejo da minha parte, mas saiba que elas estão cientes que as ações chinesas já subiram 18% desde o início de fevereiro deste ano e que as ações turcas estão surpreendentemente fortes. Para qualquer investidor que goste do "jogo" da "reversão à média", a atratividade das ações brasileiras é incontestável.

Sendo assim, concluo dizendo: É tempo de "outperformance" do IBOV. "Vem comigo Mrs. Watanabe!!!

Marink Martins

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