A falácia dos juros baixos

26/07/2019

Como podemos, em sã consciência, nos ater a premissa de que juros baixos tendem a levar a uma valorização na bolsa se temos nos dias de hoje um exemplo gritante na Europa em que tal relação não procede?

Observe que os juros baixos em 2015 não foram suficientes para evitar uma quasi catástrofe em janeiro de 2016. A solução na ocasião foi uma injeção maciça de liquidez por parte dos BCs em um evento hoje conhecido como o Acordo de Shanghai (local da reunião do G20 ocorrida no início daquele ano).

É importante que o investidor entenda a diferença entre os efeitos de uma perspectiva de redução de juros e sua materialização.

Não quero aqui argumentar contra as possibilidades de expansão econômica no Brasil. Há uma janela de oportunidade que se abre novamente. Devemos, entretanto, nos manter céticos pois, como já dizia o avô do presidente do BC: esse país adora desperdiçar uma oportunidade.

Ao olhar para o rendimento do Tesouro Préfixado para 2029, com uma taxa de 7,21%, creio ser possível acreditar que, se o trabalho for bem feito, poderemos ver uma compressão desta taxa, em um prazo de um ano, para (quem sabe?) 5,5% ao ano.

Sendo assim, fui lá em minha planilha de "Valuation" e simulei uma queda de 2% na taxa de desconto de longo prazo para ver o impacto no valor projetado. A conclusão é que, mantendo tudo mais constante, o valor projetado subiu em 40%!

O problema desta análise meu amigo reside na premissa do "ceteris paribus" (tudo mais constante). Já dizia o pré-socrático Heráclito: "ninguém nunca se banha duas vezes no mesmo rio" e por aí vai...

Na Europa os juros caem em uma tentativa desesperada do BCE de evitar uma recessão. Dependendo da forma como ocorrerá o BREXIT, é possível que a Alemanha entre em recessão devido ao atrito gerado no processo de exportação de bens para o Reino Unido.

Já nos EUA, embora o FED jamais assuma, o receio é de que a bolha no mercado acionário exploda e o índice de confiança do consumidor despenque de forma acelerada. Nunca antes na história daquele país houve uma correlação tão forte entre o comportamento do mercado acionário e o desempenho de seu PIB. De acordo com o "maestro" Alan Greenspan, uma queda de 10% no índice S&P 500 hoje impacta o PIB em 0,5%. E olha que economistas sempre subestimam esses números.

E no Brasil, hein? Por que será que estamos baixando os juros? O Brasil se arrasta. Há quem olhe para a capacidade ociosa e diga: olha só que legal, o país pode crescer tranquilamente sem pressionar a inflação. Mas há também quem olhe o copo meio vazio e diga: o Brasil pode crescer sem ter que contratar ninguém! E aí, como se reduz essa taxa de desemprego tão elevada?

Nestes assuntos macroeconômicos gosto sempre de buscar referências nos trabalhos de dois colunistas do Valor Econômico que respeito muito: o Nilson Teixeira (ex-chefe de pesquisa do Credit Suisse) e o Ribamar Oliveira.

O Nilson nos alerta sobre os danos da ociosidade. Já o Ribamar nos alerta que na equação PIB = Consumo + Governo + Investimentos + Saldo da Balança, não poderemos contar com o Governo. Esse está no cheque especial. Estamos vivendo de um crédito suplementar recém aprovado.

Além disso, Mansueto Almeida já nos avisou: não há espaço para redução de impostos neste primeiro mandato de Bolsonaro.

Se não vem aumento no salário mínimo e nem aumento nos salários dos funcionários públicos, só nos resta gerar ganhos de produtividade. E embora haja oportunidades nesta frente, os efeitos levam tempo para aparecer nos dados econômicos.

Recentemente, ouvi um otimista (ou seria um ufanista?) dizer que o Brasil é um carro de fórmula 1 de 700 cavalos, acelerado, mas com freio de mão puxado. Ele complementa dizendo que se cortarem o cabo do freio de mão é capaz do carro dar um "loop"...

Caramba. Talvez você até concorde com esta visão. Eu não viajo muito pelo Brasil para, de fato, contestar uma afirmação como essa. Confesso que achei um pouco engraçado pela entonação. Além disso, acabo de voltar do maior shopping da América Latina, o Barra Shopping, que está repleto de tapumes com imagens promissoras de que a nova loja que abrirá em breve, virá com tudo!

De volta aos mercados quero concluir com o velho CAVEAT EMPTOR (tome cuidado comprador), chamando sua atenção aos seguintes eventos:

  • A taxa de 10 anos da Grécia agora está menor do que a americana.
  • A Áustria colocou no mercado um título de 100 anos rendendo 1% ao ano. Se os juros subirem 100 basis points, o prejuízo é de 30%!!!
  • Steven Mnuchin, secretário do tesouro americano, foi à CNBC e disse que a Amazon destruiu a concorrência no varejo americano!
  • Dizem pela mídia que todo este ruído regulatório em torno das BIG TECHS não importa. Sabe por que?

Porque desta vez é diferente!!! (This time it is different!!!) Será?

Anatole Kaletsky, o otimista da casa de pesquisa Gavekal, diz que faz sentido o fato de tanto os títulos de renda fixa como os de renda variável estarem ambos nas máximas. Diz ele que a galera da renda fixa está preocupado com a inflação, e esta é inexistente. Já a galera da renda variável está preocupado com crescimento econômico, e este se mantém robusto por volta de 3,5% em termos globais.

Se eu pudesse responder ao Anatole, diria o seguinte:

Sinto muito caro Anatole mas não consigo digerir essa. Se há deflação em uma economia inundada de papel moeda em circulação é porque não há demanda. O fato das ações estarem na máxima pode ser devido a tese de que haverá sempre um comprador "tolo" de última instância. Isso pode se provar verdadeiro mas não quero eu pagar para ver!  

Acho que vou assistir mais uma vez o meu filme predileto: aquele que diz... Run Forest Run!

Um bom fim de semana a todos,

Marink Martins

www.myvol.com.br