"Equities (ações)" ou "Bonds". Onde está a bolha?

02/09/2019

Dando continuidade ao Insight de Mercado publicado aqui na última sexta-feira, recebi uma resposta do estrategista da Gavekal, Will Denyer, a respeito da minha pergunta sobre o potencial "estrago" que uma queda nos mercados poderia ter sobre o otimismo delineado em sua análise publicada no mesmo dia.

Antes de abordar sua resposta, vale destacar que Will, partindo de um ponto de vista macroeconômico, busca avaliar a melhor alternativa de investimentos no momento considerando três classes:

  • Equities (ações)
  • Bonds (renda fixa pré-fixada de prazos superiores a 5 anos)
  • Cash (renda fixa pré-fixada de prazos inferiores a 5 anos)

Indo direto ao ponto, o estrategista está definitivamente preocupado com uma eventual reversão de preços no mercado de renda fixa de longo prozo - Bonds. Reconhecendo que um aumento nos rendimentos dos títulos também teria um efeito negativo no mercado de renda variável, ele considera que o efeito de tal reversão seria mais perverso para a economia americana do que um simples movimento de aversão a risco no mercado de ações.

A razão para sua análise se apoia no fato de que é justamente este movimento de queda de juros que tende a contribuir para uma sustentação no crescimento econômico americano. Isso tende a ocorrer através de uma retomada no mercado imobiliário e de maiores investimentos por parte das empresas.

Além disso, o estrategista considera que a "bolha" está definitivamente no mercado de renda fixa de longo prazo que, em sua opinião, deve ser evitado de todas as formas.

Não se engane achando que toda esta discussão é algo trivial assumindo que ao FED não haverá outra alternativa senão seguir o movimento global de levar as taxas de curto prazo para zero ou, até mesmo, para o campo negativo. Um dos temas mais debatidos na semana passada, no que tange a este assunto, foi um texto publicado pelo ex-presidente do FED de NY (Dudley) afirmando que a instituição monetária americana não deveria "embarcar nesta onda" e sucumbir as pressões trumpianas. Todo o debate chamou atenção aos riscos associados a uma politização da instituição. De uma forma mais simples e objetiva: poderia Powell ser uma espécie de Tombini???  

Já quando a pergunta está direcionada para sabermos a melhor alternativa entre Equities vs. Cash (ações ou títulos de curtíssimo prazo), ele diz que ações ainda é a melhor opção, embora reconheça que a vantagem relativa seja mínima.

Agora, deixando a Gavekal um pouco de lado, aproveito aqui para trazer para você dois pontos de vistas de dois estrategistas que vem ocupando um bom espaço na mídia financeira:

  • Mike Wilson do Morgan Stanley
  • Michael Hartnett do Bank of America

Para o pessimista Mike Wilson, tudo dependerá do comportamento do consumidor americano. O estrategista considera que já há sinais de desaceleração mundo afora e que o resultado das empresas americanas já começa a ser impactado. Diz ele que as empresas já estão reduzindo o número de horas trabalhada e já contratam em um ritmo inferior aquele registrado no passado. Sendo assim, é uma questão de tempo para que o consumidor americano comece a "apertar o cinto". Sua estimativa é de que o índice S&P 500 irá negociar por volta de 2.700 pontos -- uma queda de aproximadamente 8% do nível atual. 

Mike Wilson nos mostra, através do gráfico acima, a deterioração da lucratividade das empresas americanas quando consideramos o índice S&P 1000 que engloba pequenas e médias empresas. Observe, através das barras azuis, que os resultados nos primeiros trimestres de 2019 foram negativos. As estimativas para 2020 permanecem elevadas.


Já Michael Hartnett extrai um otimismo no que diz respeito ao comportamento do mercado de ações para as próximas semanas baseado em sua premissa de que o posicionamento no mercado de ações embute um pessimismo exagerado. Mesmo assim, ele nos apresenta dois cenários: um otimista e outro pessimista para os mercados.

O otimista baseia-se em uma expectativa de que fundos de pensão e de "endowment" deverão realocar recursos da renda fixa para a renda variável. 

Já seu cenário pessimista se aproxima daquele delineado por Will Denyer, da Gavekal. Diz ele que caso o FED não embarque em uma política mais agressiva de cortes de juros, uma crise associada ao mercado de renda fixa poderá contaminar toda a economia, provocando, eventualmente, a tão aguardada recessão.

Hartnett nos mostra - no gráfico à esquerda - que agora há um elevado número de ações cujo rendimento sobre dividendos supera a taxa de juros dos títulos do tesouro de 30 anos; o que é positivo para as ações. Além disso, no gráfico à direita, observa-se que há espaço significativo para uma maior alocação direcionada à renda variável. 

Em suma, sou da opinião de que há crescentes riscos nos mercados. A dependência do FED acaba gerando um cenário binário nos mercados. Sendo assim, reitero a minha sugestão de investidores devam enfrentar os mercados de forma tática, com ampla liquidez. Observe que em 2019 temos um cenário em que não só as ações se valorizam, mas também os títulos de renda fixa e o ouro! Sabe quantas vezes isso ocorreu ao longo da história? Uma única vez, em 1986! O que isso me diz é que estamos navegando em um mercado que exige maiores cuidados!

Marink Martins

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