"More money than fools"

19/09/2018

Um dos indicadores mais determinantes para o comportamento dos mercados está ligado a liquidez. Um mercado líquido é um onde ativos podem ser transformados em "cash" a um baixo custo transacional. Para isso é necessário a presença de um elevado número de participantes e que seja praticado um "spread" entre o preço da compra e da venda bem "apertado".

Nos últimos dez anos, não foi difícil detectar a presença de mercados fartos no quesito liquidez. Logo após a grande crise de 2008, os mercados globais foram inundados de recursos oriundos de estímulos monetários quantitativos e fiscais. Já é mais do que notório a expansão dos ativos nos diversos balanços dos principais bancos centrais globais. Trata-se aqui de dinheiro criado pelo sistema com intuito de irrigar o sistema financeiro e dar suporte aos bancos que passaram por um período um tanto desafiador no início desta década.

Como consequência de todo este esforço, criou-se uma situação que os estrategistas da casa de pesquisa Gavekal gostam de descrever como "More money than fools" (em uma tradução livre: "mais dinheiro do que tolos"). Fartos de liquidez, os mercados se apreciaram. Os preços dos ativos de renda fixa atingiram a estratosfera e contribuíram para uma apreciação das ações norte-americanas.

O gráfico abaixo, embora já um pouco defasado, ilustra bem como os principais índices bursáteis, corrigidos pelo agregado monetário M2, não subiram tanto como os gráficos nominais demonstram.

No gráfico acima os principais índices de bolsa de valores de diversos países deflacionados pelo indicador monetário M2.

Este é um fenômeno que pode ser observado ao redor do mundo, inclusive aqui no Brasil. Quando corrigimos o Ibovespa pela quantidade de dinheiro emitido na economia, observamos que este também desfrutou do estímulo monetário local.

No gráfico acima, o Ibovespa (linha azul) comparado com o IBOV deflacionado pelo agregado monetário M4.

Tudo isso é extremamente relevante uma vez que o mundo parece caminhar em direção a um processo de reversão desta tendência.

Nos últimos meses houve uma redução no que o estrategista Charles Gave chama de Base Monetária Global que é quantidade de dólares de países estrangeiros depositados no banco central norte americano.

Como consequência, os mercados emergentes não só registraram performances negativas mas também chegaram a flertar com uma crise global devido aos problemas enfrentados pela Turquia e pela Argentina.

No Brasil estamos diante de um momento de transição. Convivemos com um problema fiscal seríssimo que deverá ser combatido por quem quer que for eleito. No ano de 2019, o novo governo terá que trabalhar para reverter um déficit primário de aproximadamente R$150 bilhões.

Sendo assim, corremos o risco de sermos forçados a conviver com uma situação oposta a esta indicado no título deste texto. É possível que tenhamos uma situação onde teremos "mais tolos do que dinheiro".

De certa forma, tal situação já se manifesta em alguns setores e empresas. Não faz muito tempo que em um dos meus comentários discuti a situação da empresa Qualicorp.

Em tal análise, apontei para o fato da empresa apresentar boas perspectivas do ponto de vista fundamentalista. Entretanto, o elevado desemprego no país gera uma espécie de "falta de liquidez" no mercado para os seus produtos. Sendo assim, embora o preço de suas ações possa aparentar ser um bom ponto de entrada, uma eventual recuperação em tal preço dependerá muito das condições do mercado de trabalho em 2019.

Neste sentido, é importante destacar que os gastos do governo representam uma importante parcela do PIB do país. Em um ano onde há uma obrigatoriedade de corte de gastos, a perspectiva de liquidez nos mercados torna-se um tanto sombria.

Sendo assim, seja bastante cauteloso ao analisar empresas que possam aparentar "baratas". Afinal, este é um conceito relativo e nada impede que o que está barato hoje fique ainda mais depreciado.

Marink Martins

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