Nos confrontamos com a verdade através da volatilidade

10/03/2018

We will only prosper if we relentlessly search for nothing but the truth, otherwise the truth will find us through volatility.

by Cristopher Cole, Artemis Capital Mgmt.

O curioso é que, embora aceitemos tal colocação como uma verdade, passamos boa parte da vida buscando eliminá-la. Neste sentido fazemos uso de tudo a nosso alcance. Nosso convívio problemático com a volatilidade deu vida a diversas "industrias"; desde a dos psicanalistas até a dos fármacos, e não vou nem me aprofundar no que fazemos nós, pais dos "millenials", na tentativa de coibir a volatilidade na vida de nossos pequenos.

No passado, falando sobre o existencialismo, o professor Alexandre Costa, da Univ. Federal Fluminense (UFF), uma vez dissera que o prefixo "bio" em grego, além de denotar vida, estava também associado a palavra arco e sua respectiva tensão. Dizia ele: não há vida sem tensão! Sua ausência é a morte.  

Já nos mercados, por aqui criamos a instituição do banco central para atenuar nosso convívio com as "mudanças de humor". E assim como fazemos com os nossos queridos "millenials", os BCs também determinaram que volatilidade é algo ruim para os mercados. Enquanto na vida fazemos uso de medicamentos como a ritalina, o efexor e o prozac, nos mercados vamos mesmo é de "QE "(estímulos quantitativos, em inglês).

Nos anos 90, a experiência dos BCs com câmbio fixo, embora não tenha conseguido eliminar a volatilidade nas bolsas, gerou uma calmaria cambial que deu certa previsibilidade ao mundo. Seu efeito de embriagues durou bastante tempo, mas cada "bêbado" que acordava da consequente "ressaca" provocada pelo intervencionismo, acabava acordando o vizinho. E assim, México, Tailândia, Indonésia, Malásia, Rússia e Brasil foram caindo. A Argentina, que exagerou na dose, foi a última a acordar.

Os anos se passaram e o nível de intervencionismo só fez crescer. O ataque de 2001 deu a Alan Greenspan, na época visto como o grande"maestro"da economia global, a oportunidade de inovar, jogando os juros para níveis impensáveis. A "mãe de todas as crises" surgiu em 2008, e embora tenha o levado a infâmia, permitiu com que "QE" fosse visto como um remédio potente e eficaz.

Passados quase 10 anos da grande crise, o mundo vem abusando deste remédio cuja bula não fala muito sobre efeitos colaterais justamente pelo fato destes serem desconhecidos. Tal ciclo parecia ter chegado ao fim no início de 2016. Mas aí, em um movimento coordenado digno de deixar Zeus irado, os BCs vieram com tudo, levaram os juros para o campo negativo e injetaram US$2 trilhões de dólares nos mercados em duas doses; uma em 2016 e outra, ainda em andamento, neste ano que se aproxima de seu fim. Dizem que Zeus, ao ver o que está na carteira de Kuroda (Banco do Japão) e Draghi (BCE), rapidamente pediu para Tânatos (deus da morte) se aquecer e se preparar para entrar em campo para combater tamanho intervencionismo.

O último que desafiou Zeus desta forma foi condenado a rolar uma pedra de mármore morro a cima em um ciclo sem fim.

Em dezembro de 2017, frustrado com o longo período de artificialmente baixa volatilidade, escrevi:

Em um mundo dominado por incertezas oriundas de ameaças terroristas, riscos geopolíticos, fim do bônus demográfico global, surgimento da inteligência artificial, intensificação da robótica, renovação da matriz energética e muitos outros, manter a Sra. Volatilidade artificialmente baixa é um sacrilégio que, naturalmente, sairá caro aos mortais.

Não demorou muito. No fim de janeiro, logo após um discurso em Davos em que o Secretário do Tesouro Americano, Steven Mnuchin, disse interessar aos cidadãos americanos ter um dólar mais fraco, os mercados finalmente refletiram uma maior incerteza.

A volatilidade disparou e provocou a derrocada de um famigerado ETF estruturado pelo Banco Credit Suisse. Muitos investidores perderam todo seu capital. 

Embora as águas de março pareçam indicar uma certa normalidade nos mercados, não levará muito tempo para que os investidores reconheçam que algo estrutural se quebrou nos últimos meses e que as forças entrópicas dos mercados passarão a se fazer presentes de forma mais nítida.

Marink Martins 

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