O Capcioso Mundo Cambial

03/11/2025

Quando a força do dólar pode esconder sua fragilidade

1️⃣ O Paradoxo do Dólar

Nas últimas semanas, o dólar vem se valorizando — e, à primeira vista, parece apenas mais um movimento técnico.

Afinal, quando medido pelo DXY, o índice tradicional que compara o dólar com o euro, iene e outras moedas desenvolvidas, a moeda americana ainda parece "barata", operando abaixo de sua média histórica.

Mas essa leitura é enganosa.

Se olharmos por métricas mais amplas, como o Trade-Weighted Dollar (que pondera o dólar pelo peso do comércio com cada parceiro) ou o REER – Real Effective Exchange Rate (que ajusta pelas diferenças de inflação entre países), o cenário muda completamente.

Sob essas lentes, o dólar segue caro — quase tão caro quanto estava em 1985, na véspera do Acordo de Plaza, quando as potências coordenaram uma depreciação do dólar para corrigir desequilíbrios globais.

2️⃣ Valorização ≠ Força

Muitos interpretam uma moeda forte como sinal de vitalidade econômica.
Mas, historicamente, grandes valorizações costumam ocorrer em momentos de estresse ou desequilíbrio.

📍 Japão, 1989:
Após o estouro da bolha do Nikkei, o iene se valorizou por quase cinco anos. Não por força econômica, mas por repatriação de capital — famílias e empresas trazendo recursos de volta ao país.

📍 Europa, 2008:
Mesmo com bancos fragilizados e recessão à vista, o euro subiu. Investidores desmontavam posições em dólares, buscando "liquidar dívidas" na moeda americana, o que sustentou artificialmente o euro.

📍 Brasil, 2013–2014:
Aparentemente, o real era uma moeda sólida. Na prática, o Banco Central intervia para manter o câmbio valorizado em pleno ciclo eleitoral, disfarçando fragilidades fiscais e externas.

3️⃣ O Dólar de Hoje

O movimento atual do dólar pode ser mais um desses episódios capciosos.
Embora os EUA ainda representem o centro do sistema financeiro global, há sinais claros de deterioração relativa frente a seus parceiros comerciais: déficits gêmeos crescentes, perda de competitividade industrial e uma política fiscal cada vez mais dependente de endividamento.

A valorização recente, portanto, pode não refletir força, mas sim fricções no sistema global de liquidez — tal como em outros momentos históricos de estresse.

⚖️ Conclusão

Em câmbio, as aparências enganam.

Moedas se valorizam tanto por confiança quanto por medo — e distinguir uma da outra é o que separa o investidor atento do distraído.

O dólar, medido apenas pelo DXY, pode parecer barato.
Mas no espelho do comércio e da inflação global, continua caro, e perigosamente confiante.

Marink Martins

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