O Hotel Califórnia brasileiro

31/05/2019

Em um determinado momento em 2016 havia um enorme receio de que empresas endividadas como a CSN, a Usiminas e a Petrobras simplesmente não conseguiriam sobreviver sem reestruturar dívidas e vender ativos.

O longo ciclo de expansão econômica, iniciado após a crise de 2008, parecia se aproximar de um fim trágico, com o preço de importantes commodities simplesmente despencando. Eis que surge algo surpreendente e ousado que acaba tendo um efeito avassalador nos mercados: um esforço sincronizado dos diversos bancos centrais em levar suas taxas de juros reais para a esfera negativa e, desta forma, fazer com que investidores ficassem sem alternativa senão sair em busca de ativos de risco. Este fenômeno ficou conhecido pelo acrônimo anglicano TINA; "there is no alternative"!

Tal acordo ficou conhecido como Acordo de Xangai e representou um importante ponto de inflexão nos mercados. Para o Brasil foi uma benção! O excesso de liquidez permitiu que empresas extremamente endividadas sobrevivessem.

Passados três anos, todo aquele esforço em escala global parece estar perdendo força. A estratégia política de isolacionismo adotada por Trump foi um banho de água fria no sincronismo global e parece estar levando o mundo para um novo paradigma.

O gráfico acima nos mostra que as ações americanas podem estar diante da tão aguardada correção. Já há quem afirme que um "bear market" se iniciou em janeiro de 2018.

Curiosamente, o Brasil se encontra em uma situação microeconômica bem mais sólida do que aquela vivida em 2016. A economia do país ainda se arrasta e há urgência quanto a necessidade de reformas. Mesmo assim, o setor privado conseguiu reduzir de forma significativa aquilo que o fragilizava: o endividamento.

Sendo assim, o país se encontra diante da oportunidade de uma década para se apresentar ao mundo como alternativa viável de alocação de recursos. O principal problema do país é conhecido por todos, assim como sua solução. A grande questão é disposição para mudar. Será que há incentivos para a casta dominante brasileira promover tal mudança?

Gosto muito da analogia feita por Louis-Vincent Gave ao dizer que os bancos centrais globais estão presos em uma espécie de Hotel Califórnia. Esta alusão a famosa música da banda Eagles se refere a situações em que, mesmo conscientes de uma alternativa para uma determinada adversidade, simplesmente não se consegue implementá-la. Diz a metáfora, em inglês: "you can check-out at anytime you like, but you can never leave".

Estamos em um mundo em que boa parte dos BCs, no mundo desenvolvido, estão de mãos atadas. O que pode fazer o Banco Central Europeu senão embarcar em mais uma onda de compra de títulos? Baixar os juros já virou uma impossibilidade dado que estes estão no "chão"...

Mas, voltando ao Brasil, vivemos refém de um Estado inchado desde que comecei a entender um pouco de economia. Dito isso, por incrível que pareça, trata-se de um problema de mais fácil solução do que aquele vivido em 2016.

Neste momento em que a economia global parece estar flertando com uma desaceleração econômica, cabe ao Brasil agir rápido. O IBOV quer subir! Há compradores neste mercado! Nesta nossa espécie de "Hotel Brasília" há duas portas: a primeira, já conhecida, nos leva ao caminho percorrido pela Argentina e Turquia; a segunda, nos leva a um lugar desconhecido, mas que certamente parece ser bem mais promissor. Precisamos somente de um pouco de coragem para largar o osso da dependência do Estado.

Mas, para fazer valer o seu tempo de ter chegado até aqui, te deixo com o seguinte comentário no que diz respeito a investimentos:

No começo deste mês, Jeffrey Gundlach - o rei da renda fixa global - disse que não sabia para onde iria a taxa de 10 anos dos EUA, mas sabia que não ficaria onde estava. Sendo assim, anunciou na conferência Sohn em NY que estava comprando volatilidade através da compra de um "straddle" utilizando opções do ETF TLT (fundo de índice que investe em títulos do governo americano de prazos superiores a 20 anos). Desde então, a taxa de juros dos títulos do governo americano despencou. A taxa dos títulos de 10 anos caiu de 2,5% para 2,2%. Suspeito que tal operação já esteja sendo bastante lucrativa para Gundlach e seu fundo Doubleline Capital.

Essa mesma analogia pode ser feita para o IBOV, pensando em um horizonte de 3 meses. É pouco provável que o índice fique entre 95.000 e 100.000 por bastante tempo. Estamos em uma situação que se apresenta cada vez mais binária. O mercado sabe disso! Uma evidência é que as opções de BOVA11 com vencimento em agosto negociam embutindo uma maior volatilidade. Sendo assim, prepare-se para um segundo semestre mais agitado e seja seletivo e cauteloso quanto aos seus investimentos.

Um bom fim de semana a todos,

Marink Martins


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