O porquê de um VIX tão baixo (Parte 2) - Quando o sintoma se transforma em causa
Quem assistiu ao filme A Grande Aposta, baseado no excelente livro de Michael Lewis (The Big Short), vai se lembrar da cena em um cassino onde a jovem atriz Selena Gomez e o famoso professor Richard Thaler buscam explicar ao público o que é e como funciona um contrato sintético; no caso específico, eles falam sobre um "synthetic CDO". A cena é, sem dúvida, uma das melhores do filme, e os atores vão além e mostram como observadores, situados ao redor da mesa de um cassino, fazem apostas entre eles com base no resultado de acontecimentos pertinentes a mesa principal. Tal comportamento, em si, não chega a ser surpreendente, pois chega a fazer parte de nosso dia a dia; afinal, quem nunca apostou com um amigo a respeito do resultado de um determinado jogo? Entretanto, a relevância da cena, no que concerne a crise do subprime americano, se dá devido ao número de apostadores, a magnitude das apostas (valores) e a distorção, em termos probabilísticos, dos possíveis resultados da aposta.
Elaborando um pouco melhor sobre tal distorção, me refiro ao fato de que, em casos extremos, as apostas eram feitas de um forma em que uma das contrapartes apostava na manutenção do status quo (tudo continuará o mesmo), enquanto a outra apostava em um "cisne negro" (um evento raro, de baixíssima probabilidade). Neste tipo de aposta, análogo a um seguro-catástrofe, a seguradora normalmente ganha! Ganha com tanta frequência, que muitas vezes, dotado de excesso de confiança, peca na administração de suas reservas técnicas que a salvarão em momentos adversos. Em 1992, o furacão Andrew 65 pessoas e levou 15 seguradoras a bancarrota.
Conto toda esta história para ilustrar uma crescente aposta paralela, um "side bet" em contratos de opções de VIX (aquela medida de volatilidade associada ao índice S&P 500). Descrito pela mídia financeira como o índice que registra o "medo" presente nos mercados, o VIX é uma espécie de sintoma do que está por vir. Um VIX elevado indica que o "soberano" mercado aposta em maiores oscilações para o índice S&P 500 para os próximos 30 dias. Um VIX mais baixo, o oposto. Como muitos sabem, assim como alemães gostam de engenhar máquinas, Wall Street gosta de engenhar produtos financeiros. O próprio VIX foi criado em 1993. Não demorou muito para que fossem criados também contratos de opções sobre o VIX. Um contrato onde o investidor pode apostar no que originalmente era para ser só um indicador, ou, em termos médicos, um sintoma. Quando isso ocorre, é só uma questão de tempo para que tal "sintoma" se torne a causa de algo que, em alguns casos, pode ser inusitado.
Dito isso, existe uma aposta no mercado que tem sido um "dinheiro fácil", ou como os americanos gostam de dizer, um "sure bet". Tal aposta tem sido a venda de volatilidade. Explicando melhor, a venda de contratos de opção cujo ativo subjacente é o VIX. É o derivativo do derivativo. Quanto maior o número de vendedores, maior a pressão vendedora. O fim deste ciclo é mais previsível do que o fim da trama da novela das 9. O gráfico abaixo ilustra o número de contratos especulativos em futuros do VIX. Lembre-se que além de contratos futuros, há também contratos de opções sobre os mesmos. O gráfico, por si só, não é um indicador que este evento causará uma crise. Porém, a data de vencimento destes contratos deve ser um mais um fator a ser incorporado a agenda daqueles que atuam nos mercados com frequencia.
Marink Martins, CNPI