O que será que ocorreu com a inflação?

29/04/2019

Se você nasceu antes de 1980 provavelmente se lembra do terror que é conviver com preços que se elevam com frequência. Os mais novos chegaram a conviver com um repique inflacionário em 2015, mas nada que se compare ao que foi visto no período entre 1980 e 1993 aqui no Brasil. Mas se a inflação ainda é uma espécie de "monstro" para alguns países em desenvolvimento (Turquia, Argentina), ela parece ter simplesmente desaparecido do mundo desenvolvido. O que será que aconteceu?

Louis-Vincent Gave, fundador da Gavekal, vem dedicando seu tempo a formular teses que respondam à pergunta acima. Trata-se de um belo trabalho e quero compartilhar, de forma introdutória, aqui com vocês algumas destas teses:

  • A formação de "empresas zumbis"
  • A revolução do "Shale gas/oil"
  • O esforço contracíclico chinês

A formação de "empresas zumbis"

Ao contrário do que muitos pensam, a redução da taxa de juros de forma significativa e permanente em economias abertas tende a promover deflação ao invés do contrário. O que ocorre é que a redução na taxa de juros permite a criação de empresas ineficientes que só sobrevivem em ambientes como estes. O surgimento de tais empresas, no longo prazo, contribui para um declínio na taxa de retorno associada ao segmento corporativo culminando em um processo deflacionário.

Os estrategistas da Gavekal afirmam, de forma lúdica, que a redução de juros "abusiva" promovida pelo banco central europeu, por exemplo, criou uma espécie de Hotel California (alusão a música de 1976 da Banda Eagles) dos bancos centrais - um ambiente onde você imagina poder sair a qualquer momento, mas simplesmente não consegue.

A revolução do "Shale Gas/Oil"

Nos últimos 10 anos a produção de petróleo dos EUA oriunda da extração da commodity da pedra de xisto, através da tecnologia de fraturamento hidráulico, subiu de 5m/dia para patamares superiores a 12m/dia. Isso certamente é uma das maiores contribuições para o colapso dos índices de preços aos consumidores (IPCs) no mundo desenvolvido.

Em 2015, ano que sucedeu a derrocada no preço do barril de petróleo, foi um ano de deflação nos EUA. De lá para cá, o preço voltou a subir, mas há certamente outros fatores associados a demografia e avanços tecnológicos que vem contribuindo para manter a inflação em patamares mais baixos.

O esforço contracíclico chinês

O partido comunista chinês é mais temeroso a um repique inflacionário do que outras lideranças em países desenvolvidos. Isso ocorre pela percepção de instabilidade associada a eventos desta natureza. Estudiosos dizem que a rebelião ocorrida na Praça da Paz Celestial em 1989 não teria ocorrida caso a inflação do país não estivesse rondando em patamares superiores a 20% ao ano.

Dito isso, os chineses lutaram contra a iniciativa do FED em embarcar em diversos estímulos quantitativos no início desta década. Eles chegaram até a sinalizar que comprariam um volume menor de títulos do tesouro americano caso Ben Bernake lançasse o que ficou conhecido como QE3. Como sabemos, os americanos ignoraram tal pedido.

Assim, só restou aos chineses promovem ações contracíclicas. Do início da década até hoje, a expansão de crédito na China caiu de patamares superiores a 30% para um nível um pouco acima de 10%.


Esse fator, em conjunto com diversos outros fatores que pretendo compartilhar com você que acompanha o meu trabalho, representam algumas causas para o aparente desaparecimento da inflação.

Mas, preste atenção! O tema está de volta! Converse com um californiano e ele certamente vai reclamar do preço do combustível por lá. Vou acompanhar de perto e passar a você formas de se proteger de um eventual ressurgimento deste que normalmente está associado a períodos de enorme desafio para a economia global.

Marink Martins

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