Qual é a verdadeira ameaça ao crescimento econômico global?

10/05/2019

Diante da pergunta acima, o mais provável é que boa parte dos agentes do mercado responda dizendo que a guerra comercial entre EUA e China, com uma consequente onda de protecionismo, represente a principal ameaça para o crescimento econômico no mundo.

Isso sem dúvida é algo preocupante pois representaria uma reversão de um processo iniciado após a queda do muro de Berlim que culminou no que chamamos de globalização. Vivemos um longo período conhecido como "deflationary boom" que não só permitiu uma maior produção de bens e de serviços, mas também, que estes chegassem a um número cada vez maior de usuários, espalhados ao redor do mundo.

Entretanto, por trás desta guerra comercial que poderá representar uma enorme disrupção na cadeia de suprimentos global, está um problema ainda mais sério: como financiar o crescente déficit orçamentário dos EUA?

Só no ano passado o tesouro americano teve que emitir US$1.3 TRILHÕES em títulos do tesouro americano para rolar sua dívida. Este ano, algo próximo a isso já está em curso.

O problema é que os EUA vivem um problema estrutural. Com o envelhecimento da população as despesas associadas a previdência e saúde devem crescer de forma significativa. Assim, fica a questão: quem vai bancar a festa?

Uma das formas de se fazer isso é reduzindo o custo do financiamento da dívida. Talvez seja por isso que Trump esteja constantemente bombardeando o FED, clamando por juros mais baixos. Observem no gráfico abaixo as estimativas feitas pelo órgão independente conhecido como CBO ("Congressional Budget Office") para os gastos obrigatórios dos EUA:

Bem, o gráfico acima nos mostra uma situação explosiva. Os gastos obrigatórios subirão rapidamente do nível atual de 12% do PIB para 15% em 2030. Sendo assim, há uma clara expectativa nos mercados que, em breve, o banco central americano terá que monetizar a expansão deste endividamento. Em outras palavras, o FED terá que criar dinheiro para pagar essa conta que não fecha. 

Se este for o caso, temos aí algo que impacta diretamente na precificação do dólar pois não dá para mencionar "monetização de dívidas" sem pensarmos em inflação. Afinal, como dizia o economista Jack Rueff: a inflação advém do gasto com iniciativas que não geram retornos financiados com recursos que ainda não existem.

E aí, o que será do dólar? Será que este vai se desvalorizar ou será que este vai se apreciar?

Observe que em caso de uma crise global, o mais provável seja que o dólar se valorize pois os EUA ainda representam uma espécie de porto seguro. Em uma crise, normalmente, há grande demanda por títulos do tesouro americano. Por um outro lado, uma crise certamente derrubaria o preço das ações, criando um problema sério para a reeleição de Trump, que já deixou claro que o comportamento do mercado é a verdadeira medida de êxito de sua administração.

Uma outra alternativa seria uma de depreciação do dólar. Essa, por outro lado, contribuiria para frear o consumo dos americanos e, consequentemente, reduzir o déficit em conta corrente do país. Tal evento provavelmente resultaria em uma valorização de ativos cíclicos ao redor do mundo. A forma como isso seria feita poderia ocorrer em uma espécie de mini acordo de Plaza onde os chineses seriam forçados a valorizar sua moeda de forma análogo ao que os japoneses tiveram que fazer nos anos 80. Discuto este assunto no vídeo abaixo:

Em caso de uma desvalorização do dólar é provável que os preços nos EUA comecem a subir em algum momento no futuro e que isso venha a fazer com que o FED tenha que intervir. Mas, até lá, o que realmente importa para Trump é ter um segundo mandato na mão. Não devemos esquecer também que aproximadamente 40% da receita das empresas do índice S&P 500 vem do exterior!

Assim, busco simplificar tudo o que foi discutido aqui com a seguinte afirmação: FIQUE DE OLHO NO DXY! Ele está estável, próximo a 97. Algo vai acontecer! Em breve, ele estará 94 ou 100. Se ele for para 100, teremos mais volatilidade e você deve estar preparado, com mais liquidez. Se ele for para 94, por outro lado, podemos ver uma forte valorização nos mercados emergentes - inclusive no Brasil. A decisão está nas mãos dos chineses! Será que eles aceitarão as exigências de Trump para uma valorização do Renminbi?

Confesso que estou mais cético e navegando nos mercados com mais cautela. 

Um bom fim de semana a todos,

Marink Martins

ps: A última parte do livro traduzido "Clash of Empires" (capítulo 15 ao 19) será concluída neste fim de semana. Estou finalizando a revisão. Assim que estiver pronto, vou encaminhar por emails a todos que solicitaram.

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