Quando a compra é uma escolha e a venda uma necessidade

30/03/2020

Existem momentos de mercado em que o preço dos ativos negocia com um enorme desconto frente a preços históricos e a fundamentos. Refiro-me a momentos de crises, como a que estamos atravessando, onde uma crise de liquidez rapidamente se instaura, provocando uma onda de vendas que se faz necessária para evitar o colapso do sistema financeiro.

Em 2008, quanto fui forçado a liquidar minha posição de Petrobras, eu sabia perfeitamente que as ações estavam baratas. Sendo assim, aproveito para explicar aqui porque as vendi.

Bem, sempre atuei de forma alavancada, e mesmo ciente dos riscos, atravessei por momentos adversos como a crise do Nasdaq, o ataque as torres gêmeas, a eleição de Lula, o mensalão e outras mini-crises que pipocaram ao longo do percurso. Em 2008, não só tivemos uma crise que foi bem mais severa, mas também tivemos uma bolsa que decidiu elevar as chamadas de margem para níveis inusitados. O tal "intervalo de margem" da Petrobras (input associado as chamadas de margem no mercado de opções e de termo no Brasil) que era de 12% no início de 2008, fechou o ano em 35%!!! Isso quer dizer que as chamadas de margem praticamente triplicaram em um período de 3 meses. Sendo assim, me vi em uma situação insustentável no início de outubro de 2008. Fui forçado a encerrar posições simplesmente por falta de colateral suficiente para a manutenção das posições. Teria eu sido uma vítima do sistema? Lógico que não!

Regras mudam o tempo todo. Com o tempo, aprendemos que devemos nos preparar para adversidades. O livro Antifrágil do Taleb faz um ótimo trabalho de preparação. Melhor ainda é o seu segundo livro: Iludido pelo Acaso. Em uma aula que gravei pela Empiricus disse que caso eu tivesse lido tal livro, provavelmente teria evitado as enormes perdas que tive em 2008. Será?

A verdade é que a crise me transformou. Eu que estava "voando" durante os anos que antecederam a crise de 2008, me vi, após alguns anos traumáticos, forçado a voltar ao mercado de trabalho formal. Passei pela área de RI da BRIN3, e em seguida, atuei pela ICAP. Foi certamente um período de difícil adaptação, mas de enorme aprendizado.

De volta ao tema central deste texto, a venda de ações em momento de crises faz-se necessária não só devido a chamadas de margem no mercado, mas também a chamadas de margem em casa. Verdade! Muitos necessitam vender ativos para honrar com outras obrigações que foram assumidas tomando como premissa um cenário otimista ou mesmo a manutenção do status quo.

Por tudo isso, a velha diversificação, que, em momentos de euforia muitas vezes é deixada de lado, nos mostra todo o seu valor durante as crises. Aquele que se manteve fiel ao Tesouro Selic durante o oba-oba visto no último trimestre de 2019 (desculpe-me pela inconveniência, mas avisei bastante por aqui), pode agora adquirir ações descontadas que provavelmente registrarão bons retornos nos próximos anos. A estratégia de comprar ativos quando há "sangue nas ruas" é quase que imbatível. Difícil, porém, é ter a disciplina para chegar nesta fase com a liquidez necessária para tirar proveito desta oportunidade que se faz presente.

Marink Martins

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