Reflexões sobre o "Black Monday" de 1987
Este texto foi escrito no dia 22-out-2018
Tenho estudado a respeito de alguns paralelos entre o comportamento dos mercados nos dias de hoje e aquele vivido nos meses que antecederam o famoso crash ocorrido no dia 19/10/1987 - Black Monday.
Há um paralelo interessante entre o recente sincronismo dos bancos centrais -- tema preponderante em 2017 e no início deste ano -- e os esforços feitos pelos BCs via o Acordo de Plaza (1985) e o Acordo de Louvre (fevereiro de 1987). Na época, havia muita instabilidade cambial. A moeda americana se apreciara demais de forma a causar uma enorme escassez de dólares ao redor do mundo.
Com isso, em uma reunião do G7 no Hotel Plaza em Nova York foi decidido que medidas direcionadas seriam tomadas para gerar uma valorização do iene e do marco alemão frente a moeda americana.
O acordo foi um sucesso. A moeda americana se depreciou de forma significativa - o dólar se desvalorizou 51% frente ao iene entre 1985 e 1987 - e com o dólar barato as bolsas globais viveram um longo período de euforia.
Em fevereiro de 1987, com um dólar já bem mais fraco, buscou-se um novo equilíbrio através de um novo acordo, este assinado no Louvre em Paris e conhecido como o Acordo de Louvre. Neste, o objetivo fora corrigir os excessos provocados pelo Acordo de Plaza que provocara a derrocada da moeda americana.
O que é curioso ao estudar o tema é ver que, como sempre, as medidas são sempre bem intencionadas. Vejam algumas das determinações do Acordo de Louvre e observe a relação com os problemas contemporâneos:
A França se comprometeu em cortar o seu deficit orçamentário em 1% do PIB, e cortar impostos para empresas e pessoas físicas.
O Japão se comprometeu em reduzir o seu superavit comercial e manter os juros baixos.
A Inglaterra se comprometeu a reduzir os gastos e os impostos.
A Alemanha, protagonista no cenário europeu, também se comprometeu em reduzir déficits orçamentários, reduzir os impostos, e, assim como o Japão, manter os juros baixos.
Já os EUA se comprometeram em reduzir o déficit registrado em 1987 de 3,9% do PIB para 2,3% em 1988, em reduzir os gastos em 1% do PIB, e manter os juros baixos.
Tudo lindo! Só faltava combinar com os Russos!!! (Aqui uma brincadeira, pois ainda estávamos na época da União Soviética).
A paz e a euforia dos mercados culminou no já conhecido tema que exploro neste comentário. Após observar um aumento nas taxas de juros durante o verão de 1987, o BC alemão (Bundesbank), que na época era extremamente vigilante quanto a qualquer sinal inflacionário, entrou em pânico. Em outubro de 1987, os alemães (sempre eles, rsrs) elevaram os juros.
Irritado com a "trairagem" alemã, o secretário do tesouro norte-americano, James Baker, não deixou barato e, em um domingo, dia 18/10/1987, ao dar uma entrevista para o programa "Meet The Press" declarou: "Não iremos ficar parados observando os países superavitários elevarem suas taxas de juros e provocarem uma recessão global na expectativa de que os EUA irão salvar o mundo...".
Na segunda-feira, dia 19/10/1987, estava claro para todos que o Acordo de Louvre estava morto e enterrado. Com isso, o índice Dow Jones Industrials despencou.
Uma curiosidade que julgo fascinante a respeito deste evento é um fato revelado por Alan Greenspan, presidente do FED que tinha assumido o posto há poucas semanas, que durante grande parte deste dia ele estava em um avião comercial voando para Dallas no Texas. Sem acesso a um telefone, só ficou sabendo da magnitude do movimento após a aterrissagem quando os mercados já haviam registrados a sua maior queda da história.
Ao traçar um paralelo com os dias de hoje, observa-se que os mercados pareciam estar caminhando para uma catástrofe no fim de 2015, com a moeda chinesa se desvalorizando e os preços de commodities -- como o petróleo, o minério de ferro e o cobre -- despencando.
Os obsessivos de mercado como este que vos escreve lembrarão que os mercados em janeiro de 2016 pareciam caminhar para uma grave crise global. Eis que, em fevereiro de 2016, em um encontro do G20 em Shanghai é feito uma espécie de um "Shanghai Agreement", onde os japoneses e os europeus se comprometeram a levar suas taxas de juros para o terreno negativo e a comprar todo tipo de ativo nos mercados como se não houvesse amanhã.

Na tabela acima temos as alterações no total de ativos registrados pelos principais BCs globais: o FED (EUA), o ECB (Europeu), o BOJ (Japão), o BOE (Inglaterrra). Observe o volume de compra de ativos implementado pelos europeus (ECB) e pelos japoneses (BOJ) durantes os anos de 2016 e 2017.
Não há dúvidas que este acordo que levou ao famoso sincronismo dos bancos centrais ao longo dos anos de 2016 e 2017 está sob ataque desde o início da postura protecionista instaurada por Donald Trump a partir do segundo trimestre deste ano.
Bem, para não fazer deste texto uma longa dissertação, vale ressaltar que as intervenções dos bancos centrais e suas tentativas de conter a volatilidade dos mercados, historicamente, impõem ajustes significativos nos mercados.
No fim das contas, tudo sempre começa com a elevação do custo do dinheiro.
Afinal, como muito bem colocado pelo gestor da Artemis Capital Management, Christopher Cole, qualquer tentativa de conter a volatilidade dos mercados tende a ser em vão pois é através da volatilidade que chegamos à verdade. Seja nos mercados e seja na vida.
A minha esperança é que na próxima crise não caia o WiFi aonde quer que esteja Jeremy Powell.
Marink Martins