Uma festa seletiva

13/10/2020

Sabe-se que a bolsa de valores nunca foi lugar para o politicamente correto. Nesta última sexta-feira - véspera de feriado prolongado no Brasil e Columbus Day nos EUA - os agentes aproveitaram o calendário para promover uma festa onde só foram convidadas as empresas embaladas pelo fenômeno "fique em casa".

Engana-se quem pensa que se tratou de uma alta no "vazio", com baixo volume. Na última sexta-feira foi vencimento de opções semanal nos EUA e o preço das ações da Apple foi subindo aos poucos até provocar uma certa correria nos vendidos no fim do dia.

Já ontem, segunda-feira, as altas nos preços das ações do setor de tecnologia se intensificaram fazendo com que o setor praticamente recuperasse as perdas registradas durante o mês de setembro. Observe que o preço da ação da empresa mais valiosa do mundo subiu 6%! E, tem mais, a volatilidade implícita dos contratos de opções associadas a produtora de Iphones não cedeu nada; permanece por volta de 50%!

As razões para o movimento, de acordo com a mídia, são o lançamento do smartphone 5G da Apple, do PrimeDay da Amazon, e outras. Há quem diga que, passado o vencimento de opções da última sexta-feira, as ações ficaram mais "leves" e a tendência altista se intensificou.

Sabe-se que, no momento, em se tratando dos derivativos associados às ações de empresas de tecnologia nos EUA, o número de contratos de opções de compra é 3x superior o número de contratos de opções de venda. Isso não é comum, mas é o que está em curso.

Curiosamente, tudo isso ocorre em um mercado dominado por forças associadas a "momentum"; isto é, só sobem as ações que vinham se valorizando. Falar em fundamento nos dias de hoje é como se mostrar saudoso da seleção brasileira de 70 ou de 82.

Mas, e aí? O que fazer diante disso tudo? Se juntar aos vencedores e embarcar em uma narrativa de que os fortes ficarão cada vez mais fortes?

Eu poderia responder com um frustrante "depende". Contudo, vou manter a cautela e dizer que hora de aumentar bastante a liquidez.

Está certo que o preço de algumas ações tradicionais como Itaú e Ambev mostrou uma certa recuperação nos últimos dias. Já o preço das ações da Magazine Luiza parece ter rompido uma resistência e caminhar para novos patamares. Mas, será que há indícios claros de que o IBOV tenha entrado em uma tendência de alta?

Creio que não. E aqui, finalizo este texto, reiterando preocupações vigentes e indicadores de mercado que devem te convencer a se manter mais cauteloso:

  • Eleições presidenciais nos EUA: potencial de contestação, potencial de "onda azul", potencial de movimentos disruptivos em alguns setores, com possíveis impactos na tributação das empresas e nas leis de antitruste. Será que estes temas já não importam mais?
  • A introdução de CBDCs (moedas digitais lançadas pelos bancos centrais): a China está saindo na frente, mas os europeus estão caminhando em conjunto. Nos EUA, há experimentos sendo feitos neste sentido envolvendo a empresa Mastercard. As repercussões deste movimento são incertas. Há quem acredite que possam resultar em uma desvalorização do da moeda americana. Caso isso ocorra, será que as empresas de tecnologia que vem liderando os mercados de ações conseguirão manter o ímpeto altista?
  • Renovação dos auxílios emergenciais no Brasil: entramos em um recesso branco no parlamento brasileiro - todos estão focados nas eleições municipais. Será que ainda há espaço para aprovação de reformas este ano? Será que os auxílios emergenciais serão renovados para 2021? E se isso ocorrer, como será a reação dos mercados?
  • Existem outros fatores como discussões relacionadas ao BREXIT, ao setor de energia dos EUA, e outros que contribuem para um cenário de enorme incerteza. 

Estas são algumas dúvidas que me fazem crer que esta festa seletiva dos últimos dias foi somente um primeiro movimento em um passeio aleatório que tende a ganhar em intensidade nas próximas semanas. Quanto aos fortes se tornarem mais fortes? Embora possível, haja "whey protein" para dar conta do recado. 

Marink Martins

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