Volatilidade projetada vs. realizada (Parte 2)
Ao analisar o comportamento histórico da volatilidade implícita do índice S&P 500 e compará-la com a volatilidade realizada para o mesmo período, concluí o Comentário de quarta-feira com duas observações das quais gostaria de ir um pouco mais a fundo. Foram elas:
- O mercado, historicamente, superestima a volatilidade futura do índice S&P 500. Este "gap" entre as duas métricas cresceu ligeiramente nos últimos anos.
- O VIX, como indicador da volatilidade implícita no índice S&P 500 (linha amarela), não é um bom indicador de volatilidade futura, pois move-se de forma coincidente com a mudança na volatilidade realizada.
Quanto a primeira observação, julgo que tal comportamento seja coerente pois tal volatilidade implícita reflete a expectativa média de movimento para os próximos 30 dias. Tal média, entretanto, é uma daquelas métricas que carregam consigo pouco valor interpretativo uma vez que seu cálculo é fruto de um sistema complexo que abrange diversas variáveis. Dentre elas, temos a volatilidade implícita recente, temos o receio de movimento abrupto no preço das ações devido a um evento exógeno (cisnes negros), temos a influência do ágio associado ao investimento em ações (equity risk premium), etc. Tamanho é o dinamismo destas variáveis que a correlação entre a previsão e a ocorrência de volatilidade nos mostra também que este é um fenômeno no qual um indicador influencia o outro, e vice-versa. Quanto ao crescimento do "gap" entre estas duas métricas, a valorização do S&P 500 dos últimos anos, associada ao maior uso de algorítimos, vem provocando uma redução na volatilidade dos mercados. Paralelamente, cresce o número de analistas sinalizando que há uma bolha nos mercados e que há complacência por parte de investidores; tudo isso, contribui para uma maior divergência entre indicadores.
Já quanto a segunda observação, julgo que o VIX, como indicador de volatilidade futura, seja tão bom quanto a capacidade de agentes atuantes no mercado de prever eventos; algo que é, certamente, questionável. Lembro-me bem da semana que antecedeu o pedido de concordata do banco americano Lehman Brothers; evento ocorrido no dia 15/9/2008. Na ocasião, o VIX havia subido no início da semana anterior devido à turbulências associadas a Fannie Mae, Freddy Mac, etc. Na quinta e na sexta, antes do pedido da falência, o VIX estava numa descendente, refletindo expectativas de um acordo que fosse tirar do abismo tanto a Lehman quanto a Merrill Lynch. Como vimos, não foi isso o que ocorreu. A Lehman entrou com um pedido de falência, e na tarde daquela segunda-feira trágica, o fundo de "money market" Reserve Primary passou a não aceitar mais pedidos de resgates, ampliando assim a crise. O VIX disparou, e em questões de dias, atingiu sua máxima histórica, acima de 80%. Na época, a volatilidade realizada, por sua vez, fora bem superior a este patamar. A minha observação deste indicador vai muito além da crise de 2008, e o considero importante ao mercado. Seu poder de previsão, entretanto, limita-se a uma janela de algumas horas; período necessário para disseminação de informações relevantes pela mídia.
Dito isso, gostaria de aproveitar o tema, mencionar uma exceção a regra: Jim Cramer, no dia 3 de agosto de 2007, prevendo o colapso em meio a problemas como o colapso de dois fundos do então quarto maior banco de investimentos americano, Bear Stearns. Cramer, com sua experiência e network, foi capaz de prever que algo muito sério estava acontecendo. Daquele ponto em diante, embora o mercado ainda tenha se valorizado, a volatilidade implícita nos mercados ficou bem mais elevada. Veja o vídeo do momento em Cramer abre o verbo contra Ben Bernanck e companhia:
Para finalizar, incluo um gráfico interessante indicando o percentual de dias no ano em que o VIX e o índice S&P 500 estão se movendo na mesma direção. Tal gráfico pode ser interpretado como uma medida de complacência, pois espera-se um comportamento oposto, com tais indicadores movendo-se em direção oposta. Entretanto, considerando a complexidade e o tamanho da amostra, não atribuiria muito peso a estes dados.
Marink Martins, CNPI