Após o caos, o ressentimento

19/11/2020

É certo que em horas de desespero é necessário tomar medidas impopulares de forma rápida. Nesta pandemia, decretada em março deste ano, foram diversas as medidas anunciadas por governantes buscando, não só conter a transmissão do vírus, mas também preservar o bem estar do trabalhador.

Nove meses se passaram e a pandemia ainda se faz presente. Estamos vivemos uma segunda onda que começa a encher os hospitais e provocar reações de governantes ao redor do mundo.

Todavia, começamos a conviver também com os ressentimentos gerados por decisões tomadas por governantes para combater a primeira onda durante os meses de março a junho.

Refiro-me aqui a aprovação do "recovery fund" europeu, por exemplo. Por lá, países como a Hungria e a Polônia criam dificuldades de aprovação destas medidas que tem como objetivo doar recursos para países drasticamente afetados pela pandemia como a Itália e a Espanha.

Aqui no Brasil, as medidas de auxílios emergenciais adotadas deixaram um rombo fiscal imenso que gera um enorme ressentimento de segmentos atuantes no mercado financeiro. Tal ressentimento já pode ser observado através de uma taxa de câmbio que permanece descontada e uma má vontade tremenda nas rolagens de dívidas promovidas pelo tesouro nacional.

E o que dizer do ressentimento daqueles que atuam na área de serviços e de transporte? Esses setores sofrem ao redor do mundo.

Nos EUA existem diversos programas de auxílio, adotados em abril/maio, que estão saindo de cena com potencial de deixar muitos cidadãos em situação financeira delicada. O impasse político entre democratas e republicanos vem impedindo a aprovação de um novo pacote econômico necessário para a manutenção deste ciclo de recuperação econômica.

Em suma, entramos em um período em que uma parte da sociedade começa a expor seu ressentimento, seu ciúme, por não ter sido tratado de uma forma devida.

Tudo isso poderá se manifestar através dos preços dos ativos.

As últimas semanas foram marcadas por um movimento de "risk on" global. Por um período de 3 semanas houve uma trégua na guerra entre ativos de valor e ativos de crescimento; quase tudo se valorizou de forma conjunta.

É chegada a hora da realidade. Ou melhor: a hora do boleto!

E aí, o Brasil vai renovar o estado de calamidade e estender os auxílios emergenciais em 2021? Raul Velloso, hoje no Valor, diz que somente os ingênuos pensam que não...

E aí, o Brasil vai continuar com veto a Huawei no desenvolvimento de sua rede de 5G mesmo com a derrota de Trump? Há quem tema retaliações diretas ao agronegócio brasileiro por parte dos chineses.

Quem será o secretário do tesouro dos EUA? Essa é uma pergunta que está na pauta e começará a fazer preço em breve...

São inúmeros os questionamentos que eu poderia elencar por aqui. Contudo, a pergunta mais importante no que tange os mercados é a seguinte:

Será que, em meio a todos estes ressentimentos e impasses, os ativos continuarão a negociar com as mesmas relações de P/L vigentes?

Todos os agentes sabem que há algo errado nisso tudo que observamos nos mercados. A verdade nua e crua é que o P/L só está elevado, e em expansão ,quando medido em moeda fiduciária. Quando medido em ouro, ou algum ativo cuja oferta seja limitada, a história é outra.

Talvez estejamos chegando a um ponto onde os índices de bolsa nunca mais cairão se medidos em moeda local fiduciária e em um prazo de um a dois anos. E isso é preocupante!

Marink Martins

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