"Denial"

28/02/2024

Os americanos estão em "denial" (estado de negação). Explorei este tema no vídeo desta semana onde argumento que é inquestionável que as ações norte-americanas encontram-se em um patamar deveras "esticado". Neste vídeo faço uma breve jornada da relação entre o rendimento do "treasury" de 10 anos e a relação de P/L de Shiller, partindo dos anos 60 até os dias de hoje. Para assistir, basta clicar aqui.

O que é mais curioso é que este "mecanismo de defesa" psíquica, chamada em inglês de "denial", se manifesta de diversas formas através da mídia financeira. Abaixo, listo algumas observações que fiz nos últimos dias que corroboram a minha tese:

argumento 1: "It ain´t a bubble, unless it doubles!" (Não é uma bolha, a menos que dobre!)

No intuito de gerar um conforto aos "comprados", há analistas que recusam qualquer acusação da presença de bolha no mercado utilizando como argumento o fato de que o S&P 500 pouco subiu ao longo dos últimos 3 anos. O gráfico abaixo é ilustrativo do que busco aqui transmitir:

Acima, temos o retorno acumulado do S&P 500 em intervalos de 3 anos, de forma contínua ("rolling price returns"). Observe que, ao longo dos últimos 50 anos, tal índice dobrou de preço em 4 ocasiões. Em praticamente todas as ocasiões, o retorno subsequente provou-se problemático aos "comprados". Desta vez, entretanto -- considerando o intervalo de tempo em questão (3 anos) -- o S&P 500 vem registrando um retorno relativamente baixo.

Penso que esta é sim uma boa ferramenta para se detectar a possibilidade de um "crash". No entanto, ela pouco nos ajuda a evitar um "bear market" que poderá ser modesto e longo.

argumento 2: "Há uma falha na principal ferramenta que, historicamente, aponta para uma recessão!"

Muito já se falou sobre a inversão da curva de juros associadas aos "treasuries" dos EUA. Há quem diga que, quando os rendimentos dos títulos longos estão inferiores aos rendimentos dos títulos curtos, tal arcabouço representa um claro sinal de que uma recessão econômica é iminente. O gráfico abaixo nos mostra que tal relação permanece "invertida" já por um bom tempo, e até agora, nada de recessão!

Contra este argumento digo o seguinte: você já parou para pensar que não é a inversão da curva, em si, que aponta para uma recessão, mas sim, a desinversão da mesma?

De acordo com o economista-chefe da Pantheon Macro Research, Ian Shefferdson, o FED deverá começar a cortar a taxa de juros de curto prazo ("fed funds") agora em maio -- o mercado espera que o primeiro corte será em junho. Caso Shefferdson esteja certo, dependendo do comportamento dos títulos longos dos EUA, é possível que a desinversão da curva comece a ocorrer mais cedo do que o mercado espera. E isso, de forma contra-intuitiva, poderá ser um evento negativo para o mercado de ações dos EUA.

É justamente isso que acredito: o eventual movimento de corte de juros nos EUA tende a dar início a uma mudança de sentimento no mercado de ações dos EUA -- de um sentimento de invencibilidade que é predominante para um de um maior receio quanto à recessão que está por vir.

Marink Martins

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