Dia de enfeitar a vitrine

30/12/2020

Hoje é dia de "window dressing" nos EUA. Dia de enfeitar o pavão por aqui. É o dia em que gestores gastam "um extra" no mercado para fazer com que o valor de suas cotas fique no patamar mais alto possível. Como subproduto deste esforço, luta-se também por um bônus mais gordo.

Aqueles que já acompanham os meus textos há mais tempo hão de se lembrar do meu relato da "puxada" que deram nas ações da Celesc (distribuidora de energia de Santa Catarina) no fim do primeiro semestre de 1997. Sim, já se vão mais de 23 anos desde este evento, mas o repito, pois ficou registrado em minha mente pela ousadia e repercussão.

Era uma época dominada por enormes expectativas quanto a privatizações do setor elétrico. As ações da Celesc faziam parte da carteira de um dos fundos do Banco Bozano, Simonsen que ia muito bem naquele primeiro semestre de 97. Na verdade, era raro achar um fundo que não estivesse performando bem naquele semestre, pois a bolsa só fazia uma coisa: subir.

Todavia, aquele fim de semestre era especial para o jovem gestor do fundo de ações do Bozano. Ele estava cotado para ser eleito o "destaque" do semestre - uma posição que, se conquistada, o daria prestígio e uma bela bolada nas próximas semanas.

Ciente do que estava em jogo, o jovem gestor aproveitou o cenário de baixa liquidez no fim da tarde do último dia do semestre e promoveu uma puxada de respeito. Levou o preço das ações da Celesc de aproximadamente 45c para 67c nos trinta minutos finais do jogo. Embora a alta, medidas em termos percentuais, não fosse tão expressiva assim, a cota do fundo se apreciou de forma expressiva devido a elevada concentração em ações da empresa catarinense.

No fim, deu tudo certo para o jovem gestor. Em duas semanas, ele foi de fato reconhecido como o destaque do semestre, levando para casa uma quantia suficientemente alta para comprar um apartamento no Alto Leblon, no Rio de Janeiro. Algo que, de fato, ele fez um mês após o recebimento do bônus. (Vale um adendo aqui que o gestor era, de fato, uma pessoa talentosa cujas atitudes eram dignas do prêmio recebido). Dito isso, a tal puxada foi uma espécie de cereja do bolo.

Agora o mais importante desta história talvez esteja associado ao "gasto extra" que mencionei no primeiro parágrafo.

Naquela ocasião, em 1997, a bolsa brasileira vinha embalada registrando uma alta atrás da outra. Curiosamente, do outro lado do mundo, o controle da ilha de Hong Kong estava sendo transferido da Inglaterra para a China. O evento - embora inicialmente ignorado por brasileiros - provou-se marcante ao contribuir para um processo de desvalorização cambial no sudeste asiático que, em 2 meses, iria varrer o mundo, forçando a implementação do que ficou conhecido como "circuit breakers" na bolsa brasileira.

De forma resumida, aqueles fundos que brilharam naquele primeiro semestre entregaram tudo e muito mais nos meses subsequentes.

Como já mencionei, já se vão 23 anos! Embora os mercados convivessem em uma dinâmica analógica -- bem mais lento que o mundo digitalizado de hoje em dia - os fatores impulsionadores das altas e das baixas nos mercados são bem parecidos. Para você ter uma ideia, em 1997, a minha grande aposta era que uma importante estatal seria privatizada em um intervalo de um ano. Seu nome: Eletrobrás. 

 Hoje, gosto de pensar que já não sou tão inocente assim.

Que venha 2021!

Marink Martins

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