E se o dólar perder seu glamour?

26/04/2018

Vivemos em um período de crescente tensão entre os EUA e a China que abrange diversas frentes; desde questões comerciais até importantes questões geopolíticas relativas ao domínio naval do mar do sul da China.

Nesta batalha, que começou a ganhar corpo nos últimos meses, a importância de ser o detentor de uma moeda de reserva global dá aos EUA uma enorme vantagem. Até este momento, mais de 90% de todas as transações comerciais registradas no globo são denominadas em dólares norte-americanos.

Críticos afirmam que tal fato permite que os americanos gastem mais do que arrecadam, pois podem sempre emitir novas moedas para honrar com suas obrigações. De fato, os americanos vem poupando muito pouco, e com uma demografia adversa, as perspectivas de uma reversão deste cenário são sombrias; os gastos com saúde dos americanos (17% do PIB) estão bem à frente do resto mundo. 

Diante deste cenário e de uma nova dinâmica pós-crise de 2008, onde os diversos bancos centrais embarcaram em um processo inusitado de expansão monetária, o resto do mundo passou a questionar a liderança inquestionável da moeda americana como reserva global. Apesar de uma certa "inveja" do resto do mundo, poucos países reúnem as condições necessárias para rivalizar com os EUA. 

A China, com seu vasto território e imensa população, parece disposta a enfrentar este desafio. Sua moeda ainda está distante de ser uma referência global: transações em iuanes representam menos de 2% do volume global.

Mesmo assim, o USD vem sofrendo derrotas pontuais.

Recentemente, tanto a China como a Rússia passaram a negociar barris de petróleo denominados em iuanes. Já o Irã, como forma de pressionar os EUA a renovar o acordo que favorece o país, passou a denominar seu "ouro negro" em euros.

O fato é que apesar de estar vivendo um dos mais longos períodos expansionistas de sua história, crescem as vulnerabilidades na economia americana. Os asiáticos sabem muito bem disso e estão prontos para tirar proveito da situação de forma estratégica.

Recentemente, os chineses criaram um banco de infraestrutura e desenvolvimento para rivalizar com o banco mundial. Em paralelo, vem oferecendo linhas de swap com diversas nações asiáticas, tornando-se assim, um financiador de última instância.

Críticos afirmam que a falta de conversibilidade do iuane representa um grande impeditivo para as ambições chinesas. Entretanto, especialistas na região, dizem que a China poderia resolver tal questão facilmente ao atrelar sua moeda ao ouro. Algo que alguns já afirmam estar em curso, uma vez que os chineses e russos são vistos como grandes compradores do metal.

Abaixo, segue um gráfico com a relação entre o preço do ouro e a taxa de juros de 30 anos norte americana (linha azul). Caso haja um rompimento onde a linha azul supere a linha vermelha (média móvel de 5 anos), tal evento poderá ser interpretado como um enfraquecimento da moeda americana.

Tudo isso nos leva a pensar sobre a possibilidade de entrarmos em um ciclo inflacionário com desvalorização da moeda norte-americana. Caso isso ocorra, estaremos diante de um importante período de realocação de recursos. Algo reverso ao ocorrido nos anos 80, após o longo período inflacionário americano.

Na turbulenta década iniciada em 1970, a melhor defesa foi correr para os títulos alemães. E qual seria a melhor forma de se defender no atual momento? Os meus amigos da Gavekal acreditam que a China não deixaria esta oportunidade de retomar a hegemonia global de forma alguma! Confira o vídeo abaixo para uma melhor compreensão:

Marink Martins

Confesso estar com saudades de um mercado focado em questões microeconômicas. Do dia 27 de fevereiro para cá, entramos em uma onda ruim na qual o ruído político passou a ser o fator mais impactante no mercado de ações doméstico. Entramos em um mercado focado no "macro", à mercê do que é dito em Brasília.

Há momentos nos mercados em que os preços se deslocam de forma tão surpreendente que os agentes e a mídia financeira ficam simplesmente perplexos. Como consequência, passamos a ler e ouvir explicações para os surpreendentes movimentos que soam como meras simplificações em meio a algo que é certamente complexo.

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