Faltou tinta na "canetada" chinesa!

23/10/2018

Após uma segunda-feira morna nos mercados em que seus agentes não demonstraram convicção no movimento de apreciação das ações chinesas, temos hoje um mercado que promete emoção.

Conforme venho discutindo em meus comentários, caminhamos para um evento com características binárias no que diz respeito a dois temas muito importantes no mercado:

  • Existe a possibilidade de um acordo de curto prazo entre EUA e China no que tange a tensão comercial instaurada por Trump?
  • Existe a possibilidade de que o FED irá sinalizar ao mercado que sua política de normalização das taxas de juros será sensível as condições do mercado de capitais?

Neste momento a resposta para as duas perguntas acima aparentam ser um NÃO que provavelmente ficará oculto e deverá ser interpretado através dos gestos daqueles que exercem influência sobre estas decisões.

No que diz respeito a guerra comercial sino-americana venho trazendo para você a análise de uma das pessoas que mais sabe sobre este assunto: Arthur Kroeber, chefe de pesquisa da Gavekal.

Arthur, com quem já estive em diversas ocasiões representando a ICAP, foi um dos primeiros a mostrar seu ceticismo quanto a possibilidade de uma solução rápida para o conflito. Para ele, que é um nova-iorquino residindo em Pequim há anos, os interesses americanos vão muito além da busca por um equilíbrio comercial entre as duas nações. Os americanos querem coibir a transferência forçada de conhecimento promovido pelas instituições chinesas ao abrirem seus mercados para empresas americanas. Por tudo isso, Arthur vem afirmando que estamos diante de uma guerra de exaustão ("war of attrition") que poderá durar por bastante tempo.

Seus efeitos, entretanto, já podem ser facilmente detectados através da cadeia de suprimentos desenvolvida ao longo dos últimos 20 anos entre os dois países em questão. Tarifas de um lado e desvalorização cambial do outro, em conjunto, contribuem para um maior atrito capaz de gerar inflação de custos e reduzir a atividade econômica de ambos.

E é justamente com base neste tema econômico que o barulhento Jim Cramer, âncora do programa Mad Money na CNBC, vem conclamando que Jerome Powell deveria fazer um "walk back" do seu comentário feito há três semanas, em que dizia que o processo de normalização das taxas de juros ainda teria um longo caminho pela frente.

Antes que você precipitadamente classifique a atitude de Cramer como uma tentativa de se alinhar com os "comprados" por interesse próprio, é importante ressaltar que sua crítica ao comportamento de Powell toma como base reclamações de empresários de diversos setores que já demonstram sinais claros de desaceleração. Em particular, os setores ligados a construção civil e venda de automóveis já parecem caminhar para uma recessão. Já o setor bancário parece nem ter desfrutado da euforia vista no "bull market" dos últimos dez anos.

Dito isso, é possível que estejamos diante de um período propício a um "divórcio litigioso" entre os governantes e a autoridade monetária. Afirmo isso com base na minha releitura de um clássico que guardo com muito carinho: Alan Greenspan, The Age of Turbulence.

No fim dos anos 80, Greenspan se viu forçado a cumprir seu mandato e a elevar os juros mesmo diante da ira de George Bush (o pai). É certo que os tempos são outros, mas os problemas, por incrível que pareça, são bem semelhantes.

Concluo chamando atenção ao fato de que caminhamos para um primeiro trimestre de 2019 nos EUA em que os indicadores econômicos deverão, em termos comparativos, ser bem inferiores daqueles registrados ao longo do mesmo período em 2018 devido aos efeitos da repatriação de recursos e cortes de impostos. Além disso, vale ressaltar que o Banco Goldman Sachs está, neste momento, entre as instituições mais conservadoras, projetando mais 5 elevações de 25 bp na taxa básica americana - uma em dezembro e mais 4 incrementos ao longo de 2019.

Por tudo isso, concluo com o meu velho - CAVEAT EMPTOR!

Marink Martins

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