O "All In" dos mais velhos

11/07/2023

Chamou muita atenção na mídia financeira uma reportagem publicada no Wall Street Journal da semana passada que dizia o seguinte:

"Metade dos investidores portadores de planos de aposentadoria 401k administrados pela gestora Vanguard (dos que fazem gestão ativa de suas carteiras) e que têm mais de 55 anos de idade possuem, neste momento, mais de 70% de seus recursos investidos em renda variável. Em 2011, tal percentual era de somente 38%. Já na Fidelity Investments, 4 em cada 10 investidores com idades entre 65 e 69 anos possuem 2/3 de suas carteiras alocadas em renda variável.

E não são só os "baby boomers" (aqueles que nasceram entre 1946 e 1964). Dados referentes a contas em corretoras administradas pela Vanguard, indicam que 1/5 dos investidores com mais de 85 anos de idade estão com 100% de seus recursos alocados em renda variável. Em 2012 tal percentual era de somente 16%. O mesmo pode ser dito de quase 1/4 daqueles com idade entre 75 e 84 anos."

Penso que é justamente isso que acontece em uma economia "paternalista", onde adversidades no mercado de capitais são enfrentadas através de injeções de liquidez promovidas pelo "pai" FED. Curiosamente, hoje no próprio Wall Street Journal há uma outra impactante manchete:

Sexo, drogas e planilhas: Dr. Glazer combate o crescente vício de Wall Street (a reportagem fala de "traders" e outros gestores que enfrentam questões psicológicas associadas a profissão/hobby).

Poderia aqui dedicar alguns parágrafos para criticar avanços tecnológicos que contribuem ao nosso isolamento, compulsão, etc. De 2017 a 2018 observamos o excesso de trading em criptomoedas seguido de um espetacular colapso nos preços. Hoje, apostas classificadas como "investimentos esportivos" invadem as casas brasileiras de forma assustadora. Não vai demorar muito para termos na nossa bolsa uma empresa como a casa de apostas norte-americana DraftKings.

No entanto, prefiro me ater ao impacto que as informações acima podem ter na precificação de ativos. Não me surpreenderia ao saber que boa parte da alocação dos investidores mencionados na reportagem do Wall Street Journal estejam "posicionados" em ações da Apple e da Tesla -- duas das empresas com mais acionistas no planeta. Tratam-se de empresas cujos preços de suas ações negociam a múltiplos de Preço/Lucro bem "esticados" quando comparados aos seus históricos de negociação.

Não quero aqui afirmar que o mercado americano esteja diante de um iminente "crash" devido ao que busquei descrever acima. O fato é que este tipo de comportamento não é uma novidade. Em 1999, no auge da bolha do Nasdaq, a Microsoft, a Cisco, a JDS Uniphase eram as mais queridinhas da época. As ações das duas últimas colapsaram. Agora, mesmo a poderosa Microsoft, amargou um longo período de queda no preço das ações, apesar de crescimento nas vendas e no lucro da empresa.

Já escrevi sobre a importância de coesão entre acionistas. Trata-se de um tema de difícil aferição. No entanto, podemos inferir com base no número de acionistas e percentual das ações em circulação no mercado. Um olhar nesta direção nos mostra como as ações da Magalu -- com mais de 500 mil acionistas -- amarga uma difícil volta. Já a Smartfit -- ainda que em uma área de atuação distinta -- conta com um percentual de ações no mercado mais baixo e uma base acionária mais coesa. Tudo isso são detalhes que, em tempos de aversão a risco, afetam o que é chamado pelo mercado de "overhang" (uma espécie de ressaca no mercado de ações).

Marink Martins

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