O caminho para o IBOV de 200.000 pontos

08/05/2024

Abaixo temos o gráfico, em dólares, ilustrando a relação entre o valor da carteira MSCI Mercados Emergentes e o valor da carteira MSCI EUA. Ao contrário do que muitos pensam, o ápice nos últimos 35 anos não foi visto durante a década subsequente à entrada da China na Organização Mundial do Comércio (2001).

O ápice ocorreu no fim de 1994 -- uma época marcada por elevação de juros nos EUA (o Goldman Sachs "balançou") e início de um forte ciclo de expansão associado à revolução tecnológica hoje conhecida como "Web 1". Naquela época, os mercados emergentes brilhavam em meio a experiência do "peg" cambial e da expansão do consumo.

De 1994 a 1998, o declínio da razão ilustrada no gráfico pode ser atribuído a diversos fatores. Dentre eles, vale destacar os seguintes:

1. Desvalorização brutal do iuane de 5,80 para 8,70 iuanes/USD. A China ainda não era tão representativa em termos econômicos, porém os efeitos da desvalorização foi sendo disseminado ao longo dos anos subsequentes, afetando todos os exportadores asiáticos.

2. Transferência do controle de Hong Kong do Reino Unido para a China em julho de 1997. Curiosamente, o Baht da Tailândia sofreu uma mega desvalorização nos dias subsequentes, dando início ao que ficou conhecido como a crise asiática de 1997.

3. A chegada de um "boom" da internet que teve como símbolo o IPO da Netscape em 1995.

Já de 1998 a 2000, os EUA viviam um tremendo excepcionalismo. O dólar estava forte e o Nasdaq registrava uma máxima atrás da outra. Mais importante, o governo dos EUA caminhava para registrar um superávit fiscal!!! Os "treasuries" eram definitivamente ativos livres de risco.

Naquela época, preocupado com a possibilidade de um choque de liquidez associado ao que ficou conhecido como "bug" do milênio (a passagem de 1999 para 2000), o FED permitiu uma expansão monetária que fez com que 1999 se tornasse o símbolo da exuberância irracional. ("Party Like 1999")

A festa durou até que o FED decidiu elevar o "fed funds". Um outro símbolo do ápice pôde ser visto também através do anúncio da fusão da "America Online" com a "Time Warner" (janeiro/2000) que a posteriori provou-se um tremendo fiasco. Depois disso, o que observamos foi aquilo que o economista John Kenneth Galbraith nomeou de "Bezzle"... segue a definição:

O "bezzle" se refere ao montante de dinheiro desviado ou roubado de uma empresa ou economia durante um período de tempo, antes que a fraude seja descoberta. Em outras palavras, é a diferença entre o que as pessoas pensam que possuem e o que realmente possuem em uma economia fraudulenta.

O tal "bezzle" se manifestou através de falcatruas detectadas em empresas como a Tyco, Worldcom, Enron, Arthur Andersen, Merrill Lynch, e muitas outras. Astros do mundo da análise de investimentos como Mary Meeker (Morgan Stanley), Henry Blodget (Merrill Lynch), Jack Grubman (Salomon Brothers) e Frank Quattrone (Credit Suisse) sofreram as consequências da desmedida por eles cometida.

Dei toda esta ênfase ao fim dos anos 90, pois vivi o excepcionalismo americano de perto, trabalhando em Nova York. De volta ao Brasil e atuando como "Equity Sales" no banco, testemunhei um momento marcante que vale a pena compartilhar:

Eu acompanhava o analista de mineração e siderurgia do Banco Bozano Simonsen em uma visita institucional a um gestor na Av. Paulista. Na reunião, não esqueço que o analista Rodrigo Marques disse o seguinte sobre o preço das ações da CSN: pelos meus cálculos, a ação tem 70% de "upside" e nesta conta estou atribuindo valor zero para a mina Casa de Pedra!!!

Aquele que seguiu a recomendação do Rodrigo, e carregou as ações, testemunhou uma valorização de 62x o capital investido entre os anos de 2000 e 2008. A alta no preço das ações da CSN não ficou restrita ao seu setor. Como sabemos o período de 2003 a 2008 representou um expressivo "bull market" em mercados emergentes em que as ações de empresas brasileiras brilharam.

Fiz todo este preâmbulo para chamar atenção de algo que é GRITANTE no gráfico acima: a relação MSCI EM/MSCI US voltou ao patamar convidativo vista no fim dos anos 90. Oportunidades como aquela detectada pelo analista do Bozano estão aí à disposição em diversos setores.

Céticos dirão que os EUA de hoje está muito à frente dos EM em comparação ao que era observado nos anos 90! Na minha opinião tal afirmação não procede.

Conservadores dirão que a taxa de juros em EM é mais convidativa em termos relativos (essa é para os amantes do IPCA + 6,5%)! Esta afirmação definitivamente não procede.

Técnicos dirão que a carteira MSCI EM de hoje é completamente diferente daquela do início do milênio! Isso é uma VERDADE. A carteira de hoje conta com uma China que tem um peso próximo a 30%. Nos anos 90, Brasil e Malásia ocupavam uma posição de destaque. Dito isso, a minha proposta aqui é apresentar um caminho para um IBOV a 200.000 pontos. Não tenho compromisso algum com a carteira MSCI EM, ainda que eu ache a parte chinesa da carteira MSCI (MCHI) poderá surpreender positivamente.

Se você está assustado com a situação fiscal brasileira nos dias de hoje, eu fico só pensando como você se comportaria durante o período natalino de 1998, logo após o momento em que Itamar Franco declarou moratória da dívida "dolarizada" emitida pelo estado de Minas Gerais. Não que a situação fiscal atual esteja uma maravilha ou seja irrelevante. O fato é que já vivemos situações muito mais preocupantes, em que as reservas internacionais se aproximavam a zero, assim como o prazo das dívidas emitidas.

Quando observo o endividamento mobiliário brasileiro, eu naturalmente fico assustado com o montante (a dívida bruta DBGG está um pouco abaixo de 80% do PIB). No entanto, fico também surpreso positivamente ao ver como ela está bem diversificada (parte pré, parte pós, parte indexada, e somente 5% dolarizada). Além disso, o prazo médio da dívida se aproxima de 4 anos. Tudo isso em meio a presença de um "colchão de liquidez" de quase 1 trilhão de reais. 

O que é mais curioso é que, em termos de "valuation" das empresas brasileiras, os múltiplos de P/L (Preço/Lucro por ação) daquela época não eram tão diferentes dos atuais. Os estrangeiros já estavam presentes no mercado brasileiro através das operações de compras diretas (Anexo IV) e dos ADRs (Anexo V). Uma situação diferente daquela pré-Anexo IV em que investidores como André Jakurski dizem ter comprado ações da Telebrás com um P/L de 1x.

Outros céticos dirão: o que importa no momento é ter acesso a Inteligência Artificial -- algo que parece ser exclusivo das "Big Techs" americanas! Neste sentido há controvérsias. Um "post" recente publicado pelo Fed de St. Louis mostra que a adoção da promissora tecnologia poderá ser lenta. Seguem os comentários do FED de St. Louis relatados pela equipe da Datatrek:

We average the reported use in surveys done in 2023-2024 and compare it against reported use in 2018; the percentage of firms reporting any use of AI in production has increased from around 3% in 2018 to around 4.4% on average across sample waves in 2023-2024.

The lack of widespread usage may continue for a while: When asked whether they expect to use AI six months from now, less than 7% of the same firms said yes. If history is any guide, AI productivity gains might take a long time to realize."

De forma resumida, o que o relatório diz é que os ganhos de produtividade associados ao uso da inteligência artificial poderão demorar bem mais do que o consenso atual.

A sigla "AI" é hoje tão famosa quanto o ".com" dos anos 90. Nesta terça-feira, na CNBC, Stanley Druckenmiller (ex-sócio de George Soros) disse o seguinte a respeito da "narrativa" "AI": diante dos investimentos necessários ("capex"), "AI" pode estar "overhyped" (sobrevalorizado) no curto prazo e "underhyped" (subvalorizado) para o longo prazo.

Conclusão:

Investir em mercados emergentes hoje é tão convidativo quanto no início do novo milênio. Só não pense que naquela época era um passeio no parque. Aquele que investiu no Brasil logo após a desvalorização cambial de 1999, teve que passar pelo apagão do ano 2001 e pela chegada de Lula em 2002.

O investidor de hoje, entretanto, parte da vantagem de sonhar com a chegada de um novo governo (mais conservador do ponto de vista orçamentário) em 2027 que poderá representar uma expansão de múltiplo de P/L associado associado às ações brasileiras.

Confesso que acredito que na próxima eleição presidencial estaremos com um IBOV acima de 200.000 pontos. O número parece alto, mas a conta é simples se você acreditar que a lucratividade consolidada das empresas do IBOV (83 empresas) estará próxima a 600 bilhões de reais. Aplique um múltiplo de 11 x e teremos uma capitalização das empresas no valor de 6,6 trilhões de reais, o que corresponde hoje a um IBOV de aproximadamente 223.000 pontos. Tal capitalização provavelmente ainda será inferior a 50% do PIB brasileiro.

Se você é amante do IPCA +6,5% ou da debênture incentivada, saiba que o investidor do início do milênio conseguiu algo bem melhor do que isso na "própria" renda fixa. Mesmo assim, isso não impediu que ele sofresse de uma imensa "dor de cotovelo" ao ver as ações dispararem entre o fim de 2002 e 2008.

Dizer que o IBOV está baratíssimo próximo aos 130.000 pontos (relativamente próximo a sua máxima histórica) pode parecer uma "forçação de barra" para muitos. No entanto, não se esqueça que vivemos em um mundo fiduciário, onde a quantidade de dinheiro em circulação cresce continuamente.

Observe o seguinte: no fim de 2005, o IBOV estava próximo a 30.000 pontos e o seu valor de mercado (48 empresas) correspondia a aproximadamente 38% do PIB. Hoje, o IBOV está um pouco abaixo de 130.000 pontos, e o seu valor de mercado (83 empresas) corresponde a aproximadamente 34,5% do PIB brasileiro.

Em um mundo fiduciário, não se deixe enganar por valores nominais. Os 130.000 pontos de hoje valem menos do que os 30.000 pontos do fim de 2005. E esta relação entre o valor de mercado e o PIB do país (medida preferida do Warren Buffet) está pra lá de 200% nos EUA. Na Índia está em 104%.

Além disso, nunca testemunhamos tanto dinheiro "empoçado" na renda fixa. A relação entre os agregados monetários M2 e M1 é de 9,6x, algo inusitado. O dinheiro para o "bull market" já está no Brasil.

Ao longo da minha carreira de quase 30 anos dedicados a renda variável, posso citar 4 pontos de entrada que se provaram excelentes e o ponto convidativo que se faz presente hoje:

1. Período de 1999 a 2002 (fim do excepcionalismo americano associado a euforia do ".com" e a entrada da China na OMC)

2. Ano de 2009 (pechincha pós-GFC, grande crise financeira de 2008)

3. Período de 2015-2016 (pechincha pós-Dilma, expansão monetária do BoJ e BCE, política de juros negativos no Japão)

4. Ano de 2020 (pechincha pós-pandemia e início da insanidade orçamentária americana (MMT))

5. Agora (Um "bull market" em mercados emergentes associado ao surgimento de um mundo MULTIPOLARIZADO; os bancos centrais precisarão carregar um menor volume de dólares em reservas internacionais, o comércio entre mercados emergentes tende a ser feito em moeda dos países envolvidos e de forma instantânea (PIX global))

O "MEDO" de perdas esteve presente em todos os momentos citados acima. Há momentos que pedem por uma maior concentração em renda variável. Penso que é chegado o momento. Dito isso, calibrar corretamente o tamanho da exposição é certamente um dos maiores desafios para "traders" e "investidores".

Marink Martins

www.myvol.com.br