Os EUA e o Consenso de Buenos Aires

25/07/2023

Nesta quarta-feira teremos a reunião do FED. E pensando nisso, aproveito o Comentário de hoje para compartilhar com vocês a visão do estrategista Marko Papic, do ClockTower Group -- um cara conhecido por todos aqueles familiarizados com os serviços de análise da RealVision.

Na visão do estrategista, há em comum entre o governo Biden e o governo Xi a necessidade de se manter a estabilidade social. Por esta razão, Papic nos informa que, mais determinante do que a dinâmica de inflação nos EUA, são as questões políticas. O que é curioso e soa como música no que diz respeito a precificação dos ativos brasileiros, é a tese de que, em nome da estabilidade social, tanto o FED nos EUA, assim como o partido comunista chinês (PCC), terão que agir em nome da estabilidade social. Observe que o estrategista não está comparando o banco central dos EUA (FED) com o banco central chinês (PBoC). Está comparando o FED com o PCC; Powell x Xi Jinping.

Em tese, ele nos diz que diante da elevada desigualdade de renda existente no país, o FED simplesmente não pode se dar ao luxo de "jogar" o país em uma recessão; mesmo que o "CPI" (índice de inflação ao consumidor nos EUA) fique de 100 a 200 "basis points" (1% a 2%) acima da meta de inflação. Papic vai adiante e nos diz que o governo americano, há tempos, abandonou medidas neoliberais associadas ao que era conhecido como Consenso de Washington -- em particular, medidas associadas a disciplina fiscal. Neste mundo pós-pandêmico, os EUA estariam atuando de acordo com o Consenso de Buenos Aires -- uma referência a diretrizes estabelecidas entre Brasil e Argentina que definiam como metas a geração de empregos e uma maior preocupação com questões sociais.

Abaixo, segue a tradução de uma parte do texto publicado por Marko Papic:

O Fed provavelmente está prestes a ficar atrás da curva conforme as pressões políticas dos EUA aumentam antes das eleições de 2024. Não prevemos um esforço sério para apertar a política monetária até depois das eleições, ou talvez apenas quando um candidato do Partido Republicano for conhecido (e somente se não for o Trump!).
A maior restrição para Jay Powell é a política. No final das contas, existe uma razão pela qual os EUA estimularam tanto durante a recessão induzida pela COVID-19. Certamente não foi medo do vírus, dada a relativamente seletiva preocupação da América com a pandemia. Como argumentamos desde muito antes da pandemia, os EUA estão operando sob o Consenso de Buenos Aires, tendo abandonado o Consenso de Washington. O estímulo fiscal e monetário em 2020-2021 foi gigantesco porque o país não tem um limite de tolerância à dor devido à elevada desigualdade de renda e aos altos níveis de polarização política. Esses fatores não desapareceram. Portanto, não há chance de que 12 tecnocratas não eleitos do FOMC (comitê de política monetária do FED) induzam uma recessão calamitosa devido a um aumento de 100-200 pontos-base no "CPI". De jeito nenhum.

O comentário acima é, sem dúvida alguma, provocativo. Todavia, o que acho de mais interessante, e que julgo extremamente pertinente, é o "peso" dado a questões políticas. Estamos a um ano e meio das eleições presidenciais norte-americanas e Donald Trump está super bem rankeado dentre os candidatos republicanos, conforme podemos ver na imagem abaixo.

Ainda não se sabe se uma candidatura Trump será viável. No entanto, poucos duvidam do potencial que tal evento traz no que diz respeito a diversas narrativas que, em tese, vem dando sustentação ao mercado. Dentre elas, talvez a mais importante seja o impulso fiscal do governo Biden e seus gastos exorbitantes com as iniciativas conhecidas como Inflation Reduction Act e o Chips & Science Act.

Penso que, no curto prazo, o cenário mais provável -- em linha com o que Marko Papic vem advogando -- é um em que o FED alivia no aperto monetário e o PCC estimula sua economia. Em outras palavras, as autoridades monetárias e governamentais irão lutar para preservar o status quo e manter Trump o mais distante possível.

Marink Martins


P.S. Aqui no MyVOL, ando bastante otimista com as perspectivas das ações brasileiras. Para entender melhor o "racional" por trás deste otimismo, confira o mais recente "MYCAP Tendências Globais" ao clicar no vídeo abaixo:



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