Prepare-se para o "Corner do Neon"

02/05/2022

Neste fim de semana fui buscar entender um pouco mais sobre processos litográficos. Fiz isso, pois confesso ter um enorme interesse em uma das empresas que hoje está entre as mais importantes do mundo. Refiro-me à empresa holandesa ASML Holdings que detém a tecnologia mais inovadora nesta seara e que é uma importante fornecedora de "wafers" de silício para a empresa TSMC -- hoje, candidata a empresa mais importante do mundo.

Sem entrar em detalhes mais técnicos em relação ao processo, aprendi que durante o processo de impressão litográfica nos "wafers" uma importante matéria prima utilizada é o gás neon -- um elemento essencial na utilização dos lasers que irão auxiliar no processo de impressão. E foi justamente aí que a minha curiosidade a respeito do processo litográfico convergiu com um importante artigo publicado por ninguém menos do que Zoltan Pozsar -- o estrategista da mesa de renda fixa do Credit Suisse NY que é um dos mais importantes gurus na atualidade.

Zoltan está pessimista com os mercados desde o início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Com passagem pela mesa de "open market" do FED de NY, o estrategista é hoje uma das pessoas mais ouvidas quando o tema é a liquidez dos "dutos" que sustentam o mercado interbancário global. Em março, ele não se cansou de nos chamar atenção a respeito dos riscos associados a um eventual calote russo e das consequentes chamadas de margens resultantes do processo. Mas aí veio aquela forte recuperação nos mercados no meio do mês de março que tumultuou tudo. Agora, com o "bear market" praticamente estabelecido, seus comentários voltam a impactar os mercados.

Em seu recente artigo, ele nos detalha como o gás neon é produzido e como o domínio russo no sul da Ucrânia deixa o mundo extremamente vulnerável a diversos "choke points" (gargalos logísticos). Ele nos conta que 75% da demanda por neon no mundo vem das empresas produtoras de semicondutores -- e aqui entram a ASML, a TSMC, a Intel e outras. Detalhe: 50% do volume de neon consumido vem de siderúrgicas localizadas no sul da Ucrânia; uma região que, em breve, poderá estar totalmente dominada pelos russos.

O que é curioso e pertinente é que os EUA proibiram a ASML de vender certos equipamentos à China por questões de competitividade. Agora temos a Rússia (hoje, em parceria com a China) em situação de poder dar "o troco" aos americanos através de algo mais básico, porém essencial a todo o processo: o neon!

Caso os gargalos logísticos descritos por Zoltan se materializem, é provável que a escassez de semicondutores que vem assolando o mundo persista de uma forma mais estrutural; de uma forma mais duradoura. E isso seria algo inicialmente bem inflacionário, até mesmo porque o próprio departamento de comércio dos EUA já disse que boa parte dos chips de alta tecnologia utilizados por lá vem diretamente da TSMC (Taiwan).

Marink Martins

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