Sobre as tensões entre os Estados Unidos e a Turquia por Mariana Ratão

15/10/2019

Caro leitor,

Neste final de semana, o presidente Donald Trump ordenou a retirada de tropas americanas no norte da Síria. E, logo após, ameaçou "destruir a economia da Turquia" caso o país "passe dos limites" em sua fronteira com a Síria. Mas qual a relação entre os acontecimentos?

Para quem se recorda, na eleição de Trump, um dos temas mais inflamados nos debates era o combate ao ISIS (Estado Islâmico). O próprio Obama era "malhado" por Trump, como "incapaz" de resolver o problema. Ainda no controle da Síria, o presidente Bashar Al Assad resiste desde 2011 para manter o poder - na Primavera Árabe os primeiros grupos paramilitares iniciaram o conflito contra o Estado Sírio, o que abriu espaço para o surgimento do ISIS em 2013. Nada parecia deter o então crescente grupo terrorista, que usou todo tipo de atentados na Síria, e por toda a Europa, para demonstrar seu poder de destruição. Como sabemos, a crise humanitária resultante levou refugiados principalmente para o Líbano e Turquia.

Como as relações na região se dão de maneira mais intrincada do que estamos acostumados, vamos primeiro pensar na Turquia. O presidente Erdogan, como sabemos, é um "democrata" do estilo Putin e Bashar Al Assad. O governo Erdogan, assim como Bashar Al Assad, considera os combatentes curdos como um grupo terrorista - como a etnia curda se concentra na Síria e Turquia, é interessante para ambos tentar destruir o grupo que luta por fundar um novo país, o Curdistão, na região. Os curdos também controlam prisões onde se encontram integrantes do Estado Islâmico.

Abaixo, demarcada em vermelho, a fronteira entre a Turquia e a Síria. O Estado Islâmico foi fortemente combatido pelos curdos e americanos no norte e nordeste da Síria, regiões agora em controle curdo. Após o anúncio da retirada de tropas americanas, Erdogan já iniciou uma operação militar para controlar a região da fronteira síria (não só na Turquia, mas dentro da Síria), matando civis curdos e tornando o confronto iminente.

Como podemos observar no ETF TUR, relacionado a Turquia, há um processo de deterioração do preço dos ativos, que se agravou no início deste ano.

Também o CDS (Credit Default Swap) turco vêm registrando máximas no mesmo período.

Pode Trump ter orquestrado a retirada das tropas esperando a iminente reação turca contra os curdos - para, logo após, sancionar economicamente a Turquia por seus atos de violência contra civis - minando a economia turca, e indiretamente remover Erdogan do poder?

Vale ressaltar que a Turquia faz parte da OTAN, o que praticamente impede qualquer desejo americano de resolver o confronto militarmente.

Taticamente falando, a asfixia econômica de Erdogan seria uma estratégia inteligente. O maior empecilho é que as próximas eleições turcas, que decidem parlamento e presidência, acontecem somente em Junho de 2023. Mas, mesmo assim, caso a situação militar se deteriore, e se agrave a crise humanitária no Curdistão, os Estados Unidos (e outros países) poderiam tentar uma manobra diplomática via ONU, processando Erdogan por crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional (TPI).

Trump acaba de "ordenar", nesta noite de segunda, o cessar fogo na região. A resposta de Erdogan a este ultimato deverá sinalizar qual será o tamanho das sanções impostas à Turquia.

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