Sobre o tal "descolamento" da bolsa

17/02/2021

Compartilho neste texto as ideias do analista Bem Carlson, da Ritholtz Wealth Management LLC, a respeito das razões pela qual o preço de alguns ativos de renda variável parece estar completamente desconectado da lucratividade corrente das empresas listadas.

Os argumentos de Ben Carlson são conhecidos de todos. Contudo, creio ser importante revisitá-los, pois o analista crê que eles permanecerão presentes por bastante tempo, abrindo espaço para que tal "descolamento" se alongue por um período superior a um ano!

De forma resumida, ele aponta para os seguintes fatores:

1. Mercados em tendência de alta - é chocante o percentual de empresas do índice S&P 500 que estão negociando acima de sua média móvel de 200 dias. Aquele que está comprado, está cada vez mais rico e mais confiante.

2. Política monetária frouxa e política fiscal ultra expansionista - Jerome Powell já nos avisou que não está sequer pensando em pensar em elevar os juros de curto prazo ("fed funds"). Além disso, do ponto de vista fiscal, a economia que recebeu 900 bilhões de dólares em dezembro, deverá receber mais 1,9 trilhões em breve. Há quem diga que Biden ainda irá tentar aprovar um pacote de 2 trilhões de dólares voltado para infraestrutura.

3. Austeridade virou palavrão - com o FED trabalhando em conjunto com o Tesouro Nacional dos EUA, parece que está cada vez mais óbvio que a escolha é pecar pelo excesso de liquidez, e não pela falta.

4. Posição patrimonial do consumidor é sólida - após diversas transferências diretas de recursos, o consumidor americano viu sua taxa de poupança disparar neste período pandêmico. Com isso, muitos consumidores reduziram suas dívidas com cartões de crédito e outros credores. Essa situação é bem diferente daquela vivida pelo consumidor durante os meses subsequentes à grande crise financeira de 2008. No gráfico abaixo: o aumento no saldo do dinheiro depositado nas contas correntes e de poupança nos EUA. 

5. Com as taxas de juros "no chão", há uma corrida em busca de imóveis - o setor imobiliário está em festa. Há muita gente refinanciando suas casas e fazendo upgrades. Curiosamente, boa parte das casas adquiridas ainda não foram construídas, o que é indicador de que a atividade econômica permanecerá em níveis elevados.

6. Processo de vacinação mais acelerado - Ao contrário do que se observa no Brasil, nos EUA o processo de vacinação vem se acelerando. Há quem acredite que no segundo semestre deste ano veremos um forte movimento de normalização no hemisfério norte.

Não há dúvida que os argumentos são fortes. Se, muitas vezes, busco convencer o leitor a respeito dos excessos nos mercados é porque levo em consideração um horizonte de tempo mais curto.

Sendo assim, creio que, neste momento, os agentes já estejam precificando boa parte dos argumentos acima. A taxa de juros dos títulos de 10 anos dos EUA vem subindo, e atingiu 1,3% ontem.

A grande questão é: será que a correlação entre bolsa e renda fixa permanecerá invertida, mostrando uma recuperação saudável?

Um dos maiores medos do mercado é ver estas duas classes de ativos positivamente correlacionadas, como observado em março do ano do ano passado.

De menor importância global, mas muito importante para os investidores brasileiros, é saber se houve uma mudança na correlação entre o preço das ações da Petrobras e o preço do petróleo.

Será que esta correlação passou de positiva para negativa diante das tensões em torno dos preços dos combustíveis e receios de uma nova greve dos caminhoneiros? Essa é uma pergunta importantíssima, pois os preços das ações das empresas de exploração e produção nos EUA não param de subir diante da alta no preço do petróleo! E há quem diga que o preço do petróleo deverá buscar patamares superiores a 70 dólares diante da constatação de que a produção americana caiu de forma significativa.

Marink Martins

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