"The Apple Bezzle 20.0"

28/01/2020

Como um cético, devo dizer que acordei revigorado. Não pense que estou feliz com a ameaça de uma pandemia global ou com as calamidades que assombram o nosso Brasil. O meu ânimo tem mais a ver com sinais de sanidade que se mostraram presentes no mercado nesta segunda-feira.

Há quem diga que os mercados estão sendo turbinados pelo FED que, assustado pela turbulência registrada no mercado de operações compromissadas ("repo market") em setembro, embarcou em mais uma onda de estímulos quantitativos. Na verdade, trata-se de um impulso global. Quase todos os bancos centrais no mundo estão estimulando suas economias de forma conjunta!

Tudo isso vem culminando no que resolvi chamar aqui de "Apple Bezzle 20.0". Ando fascinado com o conceito denominado "Bezzle", oriundo da obra do economista John Kenneth Galbraith. O termo se refere a um estoque de "falcatruas" que a todo momento está presente nos mercados, mas que, durante os períodos de "bull market" tende a atingir níveis insustentáveis. De uma forma mais lúdica, podemos dizer que o "Bezzle" é uma grande festa onde tanto o transgressor assim como a vítima celebram a criação de uma mesma riqueza. O detalhe essencial associado a este conceito é que a vítima ainda não sabe que tal riqueza está sendo transferida de seu bolso para daquele de quem ela julga ser o benfeitor, o visionário, o mago, ou qualquer adjetivo da moda.

No caso da Apple, a empresa embarcou em uma onda de recompra de ações de US$20 bi nos últimos trimestres. Isso, junto com a injeção de liquidez promovida pelo FED, contribuiu para uma das mais rápidas expansões de múltiplos já vistas entre empresas de grande porte. Curiosamente, a empresa deriva quase 20% de sua receita do mercado chinês, conforme podemos ver na tabela abaixo.

A ameaça de epidemia que, dentre inúmeras casualidades mais sérias, vem também derrubando o preço de ações ligadas aos setores de luxo e turismo, deveria ter sido mais severa com as ações da Apple. Afinal, como diz o professor especializado em marcas da Universidade de Nova York - Scott Galloway - a Apple, com suas belas lojas estrategicamente posicionadas ao lado de outras como Cartier, Burberry e Tiffany, representa um símbolo do bom gosto entre aqueles que podem comprar o seu produto.


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Contudo, quem na mídia financeira está disposta a atirar uma pedra na Apple? A empresa é hoje aquela com o maior peso nos principais índices globais. Seu presidente tem acesso livre à Casa Branca. Suas ações estão presentes nos principais ETFs. Diante de tudo isso, qual é o problema de seu "valuation" refletir um cenário de perfeição? Não estaria a economia americana atravessando um dos melhores momentos de sua história na visão do atual presidente dos EUA?

O fato, para aqueles que estão dispostos a pensar um pouco mais à frente, é que as ações da Apple sofrerão de um problema enfrentado pela Microsoft no início da década passada. Um problema associado ao fato delas serem "widely held", que se refere ao fato de que grande parte dos investidores já possuírem ações da empresa.

O ciclo de vendas de smartphones tende a seguir uma trajetória não muito diferente daquela vista com os automóveis. Embora a Apple seja uma empresa inovadora, a concorrência é grande e é global.

O resultado da empresa será divulgado hoje logo após o fechamento do mercado. Espere por um resultado que supere as expectativas pois afinal estamos em um ano de eleição e toda ajuda ao incumbente é mais do que bem-vinda.

Marink Martins

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